Imposto sobre bicicletas no Brasil é de 40,5%, contra 32%
dos tributos sobre carros
- Estudo
obtido com exclusividade pelo GLOBO revela que, na contramão da economia
verde, alta
carga tributária coloca ‘magrelas’ nacionais entre as mais
caras do mundo
Henrique Gomes Batista
y Nice de Paula
A fábrica Verden Bikes em SP produz cerca de 40 mil
bicicletas por ano Agência O Globo / Marcos Alves
RIO - Embora tenha crescido no país o discurso
pró-bicicleta, pelas vantagens ambientais, na saúde da população e para
desafogar o trânsito, o governo tributa mais as “magrelas” que os carros,
beneficiados por incentivos fiscais, que podem ser prorrogados até 2014.
Segundo estudo obtido com exclusividade pelo GLOBO e elaborado pela Tendências
Consultoria para a Associação Brasileira do Setor de Bicicletas (Aliança Bike),
o imposto que incide sobre as bicicletas no país é de 40,5% em média, contra
32% dos tributos no preço final dos carros, de acordo com levantamento da
Consultoria IHS Automotive no Brasil. A falta de incentivo fica claro na
comparação do IPI: a alíquota do tributo federal é de 3,5% para carros
populares, contra 10% para as bicicletas produzidas fora da Zona Franca de
Manaus (ZFM, onde há isenção, mas que produz apenas 21% do total do país).
Com isso, o Brasil tem umas das bicicletas mais caras do
mundo. Uma bike comum, aro 26 e 21 marchas, vendida em média a R$ 400 no
Brasil, é cerca de 54% mais cara que uma similar nos Estados Unidos, onde sai
por R$ 259, segundo pesquisas em sites de compras. A bicicleta dobrável, ideal
para uso de forma integrada ao transporte público, custa R$ 640 no Brasil,
contra R$ 477 na Alemanha.
- Com todos os benefícios da bicicleta me parece descabido
este elevado grau de impostos. A população tem se conscientizado, algumas
cidades estão criando infraestrutura de ciclovias e ciclofaixas, mas falta,
ainda, a questão tributária - afirmou Marcelo Maciel, presidente da Aliança
Bike, que reúne 53 empresas do setor.
Venda pode subir 14% com preço baixo
Segundo o estudo, em média, uma bicicleta que sai de uma
fábrica brasileira tem seu preço elevado em 68,2% devido aos impostos, levando
em conta o mix de produção do Brasil, uma vez que a produção de Manaus, 21% do
total, tem menos impostos. Levando em conta apenas o preço de uma bicicleta
fabricada no resto do país, os tributos elevam em 80,3% seu preço, ou seja,
nestes casos, uma parcela de 44,5% do preço final das bikes é tributos.
Para Daniel Guth, consultor da Associação de Ciclistas
Urbanos da Cidade de São Paulo (Ciclocidade), a tributação e seu impacto no
preços é fundamental para estimular o uso das bicicletas no país. Segundo ele,
do total de bicicletas vendidas no Brasil, 50% são destinadas ao transporte,
37% vão para as crianças, 17% usadas para lazer e 1% para corrida:
- Temos dados que mostram que 30% das pessoas que usam
bicicletas no país têm renda de até R$ 600. E uma bicicleta não sai por menos de
R$ 500, então o fator preço pesa muito.
Segundo a economista Carla Rossi, da Tendências, uma redução
de 10% do preço pode gerar aumento imediato de 14% nas vendas no Brasil. Ela
estima que, por causa do preço, o mercado das bikes, de cinco milhões de unidades
em 2011, chegará a 5,9 milhões em 2018, enquanto que o potencial, com um preço
mais justo, seria de 9,3 milhões de unidades.
- E uma redução nos impostos poderia auxiliar até na
formalização do setor, com cerca de 40% das 235 fabricantes do país informais,
de pequeno tamanho.
Quem não quer entrar na informalidade acaba se transformando
em importador. É o caso da RioSouth, empresa carioca que planejava fabricar
bicicletas elétricas em solo fluminense. Mas os sócios da empresa fizeram as
contas e viram que suas bicicletas, que hoje custam de R$ 3 mil a R$ 4 mil - no
caso da elétrica dobrável - sairiam 30% mais caras:
- Teríamos o imposto de importação de peças, pois motores e
baterias não são feitos no país, e o elevado custo da mão de obra. Não conseguiríamos
incentivos, pois somos pequenos. No fim, decidimos fazer o design das
bicicletas e fabricá-las na China - disse Felipe Tolomei, sócio da empresa. - E
esse preço ainda é alto por causa de impostos, muitos consumidores acabam
optando por comprar uma scooter, que sai a partir de R$ 4 mil.
E não é apenas o preço final que afasta os usuários. Renato
Mirandolla, gerente da Dádiva Bike, pequena distribuidora de peças e que também
produz algumas bicicletas na capital paulista, diz que os caros insumos castigam
os mais humildes:
- Um pneu de bike custa cerca de R$ 30. Um trabalhador que
use sua bicicleta todo o dia precisa fazer a troca a cada dois ou três meses,
isso pesa no orçamento.
Tablets substituem bikes
Everton Francatto, diretor comercial da Verden Bikes,
fábrica que produz cerca de 40 mil bicicletas por ano no interior paulista,
afirma que hoje o maior problema do setor é o preço. Ele lembra que uma
bicicleta para o dia a dia no Brasil custa cerca de R$ 500, contra valores
entre € 80 e € 120 na Alemanha:
- A nossa maior preocupação é justamente nas bicicletas
infantis, que custam cerca de R$ 300. Nessa faixa temos uma forte concorrência
com o eletrônico. Hoje o sonho de Natal das crianças não é mais a bike, é um
tablet, e isso gera problemas de saúde para esta geração.
Ele explica, ainda, que apesar do setor poder integrar o
Supersimples, o ICMS encarece o produto. As bicicletas estão enquadradas no
conceito de substituição tributária. Pelo regime, o valor do imposto é cobrado
tanto da indústria quanto do varejo, antes que o produto seja de fato
comercializado. Para tanto, é realizada uma estimativa do valor final do
produto ao consumidor e é feito uma cobrança quando o produto cruza uma divisa
estadual.
Procurado pelo GLOBO na sexta-feira, o Ministério da Fazenda
informou que não teve tempo hábil para comentar a reportagem. Tomado de o globo
de Brasil
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