Estudo britânico mostra que, embora maior, a proteção oferecida pela vacina contra a variante cai num prazo inferior ao do imunizante da AstraZeneca. Argumento embasa decisão dos EUA de aplicar terceira dose na população
Vilhena Soares
(crédito: Alain Jocard/AFP)
A vacina contra a covid-19 desenvolvida pela empresa Pfizer gera maior proteção contra a variante delta, porém sua eficácia diminui mais
rapidamente. Estudo realizado por pesquisadores da Universidade de Oxford
também mostrou que o imunizante da AstraZeneca apresenta igualmente queda de
eficácia com o passar do tempo, mas seu déficit é mais gradual. Apesar disso,
os cientistas garantem que as duas substâncias mantêm a eficiência contra o
novo coronavírus.
As descobertas vão ao encontro de informações divulgadas, na
véspera, por especialistas dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos
EUA (CDCs), que apontaram perda de efetividade nos imunizantes da Pfizer e da
da Moderna, ambos feitos à base de mRNA — o país aplica ainda o fármaco da
Janssen, em dose única. A ideia de aplicação extra antes que se complete um ano
da segunda dose não agrada a Organização Mundial da Saúde (OMS).
A pesquisa britânica foi feita entre dezembro de 2020 e este
mês, período em que os especialistas examinaram amostras sanguíneas de quase
700 mil pessoas. O estudo revelou que 30 dias após a aplicação da segunda dose
da vacina da Pfizer, os indivíduos imunizados estavam 90% mais protegidos
contra a variante delta do que uma pessoa não vacinada. O percentual caiu para
85% após dois meses, e 78%, três meses depois.
Já as pessoas que receberam as duas doses da AstraZeneca
estavam 67% protegidas no mês seguinte. Após dois meses, a eficácia caiu para
65% e chegou a 61% no terceiro mês. Após quatro ou cinco meses, o nível de
proteção oferecido pelos dois imunizantes é similar, concluiu a pesquisa, que
ainda não foi revisada e nem publicada em revistas especializadas.
Retrocesso
Comunicado divulgado pelo pesquisador Koen Pouwels,
principal autor do estudo, assinala que os dados vistos “representam um
retrocesso” da eficácia da vacina da Pfizer, enquanto que, para o imunizante da
AstraZeneca, “as diferenças (entre um mês e outro) são mínimas, ou seja, pode
não existir nenhuma mudança na proteção”.
Os especialistas destacaram que, apesar da leve queda do
nível de proteção, a eficácia global dos dois imunizantes continua sendo “muito
elevada”. “Ambas as vacinas, em duas doses, ainda estão indo muito bem contra a
nova cepa delta (...) Você começa com um nível muito, muito alto, mas tem um
longo caminho a percorrer, então, essa redução é algo esperado”, opinou, em
nota, a professora Sarah Walker, coautora do estudo.
A Pfizer já havia comunicado que a eficácia de sua vacina
cai com o tempo. No mês passado, a empresa AstraZeneca informou que ainda
estava investigando quanto tempo duraria a proteção de sua vacina e avaliava,
também, a necessidade de uma dose de reforço para manter a imunidade.
O estudo evidenciou ainda que pessoas infectadas após
receberem duas doses da vacina Pfizer ou AstraZeneca tendem a ter uma carga
viral semelhante à dos indivíduos não imunizados que contraíram a covid — isso
significa que eles ainda transmitem a doença apesar de protegidos.
“O que merece mais destaque é o fato de que a imunidade
coletiva pode se tornar mais desafiadora por causa disso”, ressaltou Pouwels.
“As vacinas são, provavelmente, melhores na prevenção de doenças graves e um
pouco menos (eficazes) na prevenção da transmissão”, complementou.
Outra constatação dos pesquisadores é que o tempo entre a
administração das duas doses não afeta a eficácia na prevenção de novas
infecções. Além disso, confirmou-se que as pessoas mais jovens têm uma resposta
imune maior que as mais velhas, o que já era esperado pelos especialistas.
Diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm),
Renato Kfouri destacou que as conclusões ajudam a determinar a melhor forma de
gerenciar o uso dos imunizantes. “Essas avaliações precisam ser feitas
periodicamente no uso de medicamentos, como as vacinas, principalmente, no caso
desses fármacos contra covid-19, pois como combatem uma enfermidade totalmente
nova, é difícil prever o nível da sua proteção e a duração dessa eficácia. Essa
é, infelizmente, uma limitação que temos”, opinou, ressaltando que, até o
momento, o desempenho é muito positivo.
Preocupação mundial
O estudo britânico coincide com a decisão de alguns países
de aplicar uma terceira dose da vacina contra a covid-19, ainda que em
situações específicas. Israel começou a administrar o reforço do imunizante da
Pfizer no mês passado. De acordo com as autoridades responsáveis, a medida era
necessária para enfrentar um aumento nas infecções desencadeadas pela
propagação da variante delta.
Nos Estados Unidos, o reforço começa na semana de 20 de
setembro. “Os dados disponíveis mostram claramente que a proteção contra a
infecção por Sars-CoV-2 começa a declinar com o tempo”, justificaram, em nota,
Rochelle Walensky, diretora dos CDCs, e Anthony Fauci, assessor da Casa Branca
sobre a pandemia.
“Preocupa-nos que essa tendência de declínio continue nos
próximos meses, o que poderia levar a uma diminuição da proteção contra casos
graves de doença, hospitalizações e mortes”, disse o diretor médico da saúde
pública dos EUA, Vivek Murphy.
Numa análise do cenário global, Renato Kfouri estimou que a
aplicação de uma terceira dose dos imunizantes contra a covid-19, até agora,
parece necessária apenas para grupos mais vulneráveis, como idosos e pessoas
com sistemas imunes debilitados.
“As pesquisas nos mostram que existe uma perda de imunidade
provocada pela vacina em indivíduos acima de 70 anos, além de outras pessoas
com um sistema de defesa mais debilitado, como transplantados. Essa terceira
dose é algo que deve ser adotada para esses grupos e para evitar,
principalmente, os casos graves, que podem ser mais agressivos nessas pessoas”,
assinalou o diretor da SBIm.
SAIBA MAIS
Biden na fila do reforço
O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, disse, ontem,
que ele e a mulher, Jill, receberão uma vacina reforço contra o coronavírus, em
setembro, quando estiver disponível para todos os americanos adultos. “Já é
hora”, afirmou o democrata, assinalando que ele e a primeira-dama receberam a
primeira dose no início do ano. Levando em consideração estudos que mostram que
a eficácia da imunização diminui “com o tempo” e diante da ameaça da variante
delta, o governo Biden anunciou que todas as pessoas vacinadas contra o
coronavírus com fármacos da Pfizer e Moderna nos Estados Unidos poderão receber
uma injeção extra, oito meses depois. A campanha terá início no fim do próximo
mês.
Filhotes de morcegos balbuciam como bebês
crédito: Michael Stifter/Divulgação
Filhotes de morcegos aprendem a se comunicar de forma
semelhante aos humanos, segundo estudo conduzido por uma equipe de biólogos
alemães. Os cientistas observaram que, para conseguir repetir os sons emitidos
pelos seus pais, os pequenos animais balbuciam de forma repetitiva durante a
infância, numa atividade similar a dos bebês quando começam a falar suas
primeiras palavras.
Os autores do estudo, apresentado na última edição da
revista especializada Science, explicam que pesquisas comparativas sobre o
aprendizado da comunicação são difíceis de serem feitas no reino animal. Isso
porque poucos bichos tem um sistema vocal semelhante ao homem, com exceção de
alguns pássaros que conseguem imitar vozes. “Embora a pesquisa com determinadas
aves tenha nos fornecido importantes insights sobre o desenvolvimento da fala
em crianças, é difícil realizar análises mais profundas sobre esse tema, já que
as duas espécies apresentam diferenças cerebrais anatômicas — pássaros têm uma
siringe, nós temos uma laringe”, destaca um trecho do artigo.
Para ultrapassar essas barreiras, a equipe de especialistas
decidiu avaliar o desenvolvimento da comunicação em um mamífero, o morcego
Saccopteryx bilineata. “Filhotes dessa extraordinária espécie dedicam toda a
sua infância ao aprendizado de sons que repetirão em sua vida adulta”,
justificaram os cientistas.
Monitoramento
O grupo de pesquisa estudou o comportamento de 20 filhotes
em seu habitat, no Panamá e na Costa Rica. Foram feitas centenas de gravações
acústicas e também vídeos dos mamíferos, desde o nascimento até o desmame, sem
interferência em suas rotinas. “Essa investigação foi algo único, porque nos
permitiu observar e registrar um comportamento complexo em um ambiente
totalmente natural e imperturbado”, explicou Ahana Fernandez, uma das autoras
do estudo e bióloga do Museum für Naturkunde, em Berlim.
Durante as análises, os pesquisadores observaram que os
filhotes Saccopteryx bilineata passam, em média, sete semanas balbuciando
diariamente, com longas sequências vocais semelhantes aos barulhos emitidos
pelos morcegos adultos. “O balbucio dos filhotes é audível a uma distância
considerável do poleiro e dura até 43 minutos. Vimos que é por meio dessa
repetição que os filhotes aprendem o repertório de sons que serão propagados
por eles durante toda sua vida adulta”, detalhou a pesquisadora Martina Nagy,
coautora do estudo.
Os investigadores também constataram que o balbucio dos
filhotes apresenta características semelhantes aos sons emitidos por bebês
humanos. “Por exemplo, o filhote de morcego repete uma sílaba três vezes, como
o ‘dadada’ de crianças”, detalhou Nagy. “É fascinante ver semelhanças entre
esses dois mamíferos durante a aprendizagem vocal”, acrescentou.
A equipe pretende dar continuidade ao trabalho por acreditar
que o estudo pode ajudar a decifrar mais segredos relacionados ao
desenvolvimento da linguagem humana. “Trabalhar com o aprendizado vocal entre
espécies nos dará peças novas do nosso quebra-cabeça evolutivo”, ressaltaram os
autores no estudo.
Tomado de correio brasiliense
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