Filisteus, inimigos
dos hebreus no Antigo Testamento, tinham DNA europeu
Os arqui-inimigos dos hebreus do Antigo Testamento migraram
do Mediterrâneo até a região onde hoje fica Israel. Em pouco tempo, porém,
incorporaram o DNA às populações locais, mostra estudo baseado em 30 anos de
escavações
PO Paloma Oliveto
Escavação em cemitério de Ashkelon, ao norte da Faixa de
Gaza: filisteus chegaram à região no século 12 a.C.(foto: Melissa AjA/Leon Levy
Expedition to Ashkelon)
Escavação em cemitério de Ashkelon, ao norte da Faixa de
Gaza: filisteus chegaram à região no século 12 a.C.
(foto: Melissa AjA/Leon Levy Expedition to Ashkelon)
Presentes em praticamente todos os livros do Antigo
Testamento bíblico, os filisteus são marcantes nas narrativas dos antigos
hebreus, onde aparecem como arqui-inimigos dos judeus. Porém, pouco se sabe
sobre as origens desse povo, ao qual teriam pertencidos personagens como o
gigante Golias e Dalila, mulher que traiu o guerreiro Sansão. Agora, uma equipe
de pesquisadores do Instituto Max Planck para a Ciência da História Humana e da
Expedição Leon Levy analisou, pela primeira vez, informações genéticas de
habitantes da antiga cidade portuária israelense de Ashkelon, um dos principais
assentamentos filisteus da Idade do Ferro, por volta de 2,8 mil anos atrás.
Os dados indicam que os ancestrais desse povo têm origem
europeia e migraram pelo Mediterrâneo para a porção mais oriental do
continente, chegando a Ashkelon no início da Idade do Ferro. Uma vez
estabelecidos na cidade, que fica ao norte da hoje Faixa de Gaza, o componente
genético foi sendo diluído ao longo dos séculos, sugerindo uma forte
miscigenação com populações locais e estrangeiras. Segundo os pesquisadores que
fizeram o estudo, os resultados, publicados na revista Science Advances, são um
passo crítico para entender as origens, há muito disputada, dos filisteus.
Há mais de um século, egiptólogos propuseram que um grupo
chamado peleset, que aparece em hieróglifos do fim do século 12 a.C., era o
mesmo que os filisteus bíblicos. Eles alegaram que esse “povo do mar” — uma
suposta confederação de marinheiros — atacou o Egito durante o reinado de
Ramsés III, durante o colapso da Idade do Bronze. Nessa mesma época, os
filisteus se estabeleciam na costa sul de Canaã, à medida que outras grandes
civilizações do Mediterrâneo Oriental, como micênicos e os hititas,
desapareceram completamente. Questões sobre o papel que eles e os outros povos
do mar desempenharam nesse colapso, de onde vieram e por que varreram o
Mediterrâneo têm sido debatidas calorosamente pelos pesquisadores.
De 1985 a 2016, a Expedição Leon Levy a Ashkelon, um projeto
do Museu Semita de Harvardeum, buscou a origem dos filisteus na cidade
portuária, uma das cinco urbes filisteias, de acordo com a Bíblia hebraica.
Liderada por seu fundador, o já falecido Lawrence E. Stager, e depois por
Daniel M. Master, autor do estudo publicado na Science Advances, a equipe de
pesquisadores detectou mudanças substanciais nos modos de vida dos moradores
locais durante o século 12 a.C., coincidindo com a chegada dos filisteus.
Muitos estudiosos, no entanto, argumentaram que essas alterações eram apenas o
resultado do intenso comércio local ou mesmo da imitação dos estilos
estrangeiros, e não o resultado de uma verdadeira migração populacional.
“Pool genético”
Depois de 30 anos de
escavações arqueológicas e pesquisa genética com tecnologias de ponta, os
cientistas concluíram que as origens dos filisteus pode ser traçada no nordeste
do Levante, possivelmente no sul de Anatólia (Turquia), onde um reino com o som
correspondente a “palasatini” ou “palastin” emergiu logo depois do colapso do
império hitita. De acordo com os arqueólogos do estudo, não é mais possível
teorizar que os filisteus eram simplesmente uma variação cultural local. “O DNA
mostra que não. Essas eram pessoas novas que foram para lá (onde hoje é Israel)
e levaram consigo a própria cultura e tradição”, diz Adam Aja, arqueólogo da
Universidade de Harvard e diretor-assistente da escavação de Ashkelon. As
amostras estudadas incluíram 10 restos mortais de pessoas que viveram no fim da
Idade do Bronze e na Idade do Ferro.
Em pouco tempo, o DNA dos filisteus já estava completamente
estabelecido na região, diz o estudo. “Em no máximo dois séculos, essa pegada
genética europeia introduzida durante a Idade do Ferro não é mais detectável e
parece diluída por um ‘pool genético’ local”, afirma Choongwon Jeong, do
Instituto Max Planck de Ciência da História Humana, um dos autores. “Enquanto,
de acordo com textos antigos, o povo de Ashkelon, no primeiro milênio antes de
Cristo, permaneceu filisteu para seus vizinhos, a distinção de sua composição
genética não era mais clara, talvez devido ao casamento com grupos levantinos
ao redor deles”, observa. Em nota, o principal autor do trabalho, Johannes
Krause, também do Max Planck, afirmou que os dados “começam a preencher uma
lacuna temporal no mapa genético do sul do Levante”. // TOMADO DE CORREIO
BRAZILIENSE
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