Desde 2000, o manto branco sobre o ponto mais alto do
planeta perde 46cm verticais todos os anos, mostra estudo baseado em imagens de
satélite
PO Paloma Oliveto
A cadeia montanhosa abriga 600 bilhões de toneladas de gelo:
equipe analisou registros de cerca de 650 glaciares(foto: Joshua
Maurer/Divulgação)
Foram necessários 70 milhões de anos para que o ponto mais
alto do planeta se formasse. Em apenas duas décadas, contudo, as geleiras que
recobrem os Himalaias começaram a ser destruídas em nível recorde. O icônico
manto branco está derretendo como nunca e, por ano, perde 46cm verticais desde
2000. Isso é o dobro do verificado entre 1975 e o último ano do século passado,
segundo análises de satélite realizadas há quatro décadas entre Índia, China,
Nepal e Butão.
De acordo com os pesquisadores envolvidos no estudo,
publicado na revista Science Advances, o ritmo acelerado do derretimento não
tem outra explicação a não ser o aquecimento do planeta. “Provavelmente, essa é
a indicação mais convincente de que as mudanças climáticas estão devorando as
geleiras dos Himalaias, ameaçando potencialmente os suprimentos de água de
centenas de milhões de pessoas por grande parte da Ásia”, afirma Joshua Maurer,
pesquisador do Observatório da Terra Lamont-Doherty da Universidade de Columbia
e um dos autores da pesquisa. “Nas últimas quatro décadas, é possível que as
geleiras tenham perdido um quarto de sua enorme massa, embora não tenhamos
feito esse cálculo específico”, alerta.
Chamados de Terceiro Polo, os Himalaias abrigam cerca de 600
bilhões de toneladas de gelo. Outros estudos recentes sugeriram que as geleiras
estão se perdendo e, em fevereiro, um artigo da Universidade de Bristol indicou
que dois terços da capa de gelo podem não existir mais até 2100. Porém, Maurer
alega que, até agora, as observações foram, de certa maneira, fragmentadas,
baseadas em pequenos períodos ou em determinadas geleiras de algumas regiões.
“Alguns desses estudos produziram resultados por vezes contraditórios, tanto no
que diz respeito ao grau de perda de gelo quanto às causas”, diz.
O novo trabalho sintetiza dados de toda a região, desde as
primeiras observações de satélite até o presente. A síntese indica que o
derretimento é consistente no tempo e no espaço e que o aumento das
temperaturas está por trás do fenômeno. As temperaturas variam de um lugar para
o outro, mas, de 2000 a 2016, elas ficaram, em média, 1ºC mais altas do que as
registradas entre 1975 a 2000.
Modelos 3D
Maurer e os colaboradores analisaram repetidas imagens de
satélite de cerca de 650 glaciares abrangendo 2 mil quilômetros de oeste a
leste. Muitas das observações do século 20 vieram de imagens fotográficas
recentemente desclassificadas, tiradas por satélites espiões dos Estados
Unidos, revela o cientista. Os pesquisadores, então, criaram um sistema
automatizado para transformá-las em modelos tridimensionais, capazes de revelar
as mudanças nas elevações das geleiras ao longo do tempo. Em seguida,
compararam essas imagens a dados ópticos pós-2000 obtidos por satélites
sofisticados, que transmitem mais diretamente mudanças de elevação.
Eles descobriram que, de 1975 a 2000, as geleiras da região
perderam uma média de cerca de 0,25m de gelo a cada ano devido ao ligeiro
aquecimento. Seguindo uma tendência mais pronunciada a partir dos anos 1990, a
partir de 2000, a perda acelerou para cerca de 0,5m anualmente. Derretimentos
anuais recentes resultaram, em média, em 8 bilhões de toneladas de água, ou o
equivalente a 3,2 milhões de piscinas olímpicas. “A maioria das geleiras
individuais não está se perdendo uniformemente em toda a superfície, o
derretimento tem se concentrado principalmente em elevações mais baixas, onde
algumas capas de gelo estão perdendo até 5m por ano”, afirma Maurer.
Fuligem
Alguns pesquisadores argumentam que outros fatores além da
temperatura estão afetando as geleiras. Eles incluem mudanças na precipitação,
que parece diminuir em algumas áreas (o que tenderia a reduzir o gelo), mas
aumentar em outras (o que tenderia a construí-lo). Outra influência negativa
tem relação com o fato de as nações asiáticas estarem queimando cada vez mais
cargas de combustíveis fósseis e de biomassa, enviando fuligem para o céu.
Grande parte dela acaba pousando em superfícies de geleiras cobertas de neve,
onde absorve energia solar e acelera o derretimento.
Maurer concorda que tanto a fuligem quanto a precipitação
são fatores importantes, mas, devido ao enorme tamanho dos Himalaias e à
topografia extrema da região, os efeitos são altamente variáveis de um lugar
para outro. No geral, diz ele, a temperatura é a força dominante.
A perda de gelo nos Himalaias assemelha-se ao que ocorre nos
Alpes Europeus, onde as temperaturas começaram a subir um pouco mais cedo, nos
anos de 1980. As geleiras passaram a derreter logo após esse aumento, um
fenômeno que se mantém acelerado desde então. Os Himalaias, de forma geral, não
estão derretendo tão rápido quanto os Alpes, mas a progressão geral é
semelhante, dizem os pesquisadores. O estudo atual não inclui as imensas faixas
adjacentes da Ásia, como o Pamir, o Hindu Kush ou o Tian Shan, mas outras
pesquisas sugerem que, nessas regiões, ocorre algo similar.
"Essa é a indicação mais convincente de que as mudanças
climáticas estão devorando as geleiras dos Himalaias, ameaçando potencialmente
os suprimentos de água de centenas de milhões de pessoas por grande parte da
Ásia”, Joshua Maurer, pesquisador do Observatório da Terra Lamont-Doherty da
Universidade de Columbia e um dos autores da pesquisa.
Groenlândia ameaçada
Feito na Universidade
do Alasca, outro estudo publicado na revista Science Advances mostra que o
futuro da Groenlândia pode ser um território completamente degelado. Os autores
alertam que, se as emissões de gases de efeito estufa continuarem na trajetória
atual, a ilha gelada estará derretida e árida no ano 3 mil. Para um futuro mais
próximo, o fim deste século, eles estimam que haverá perda de 4,5% na cobertura
de gelo, contribuindo para um aumento de 30cm no nível do mar. “Como a
Groenlândia se parecerá no futuro — em poucas centenas de anos ou em mil anos
—, se ainda haverá uma Groenlândia ou ao menos se ela se parecerá com o que é
hoje está nas nossas mãos”, diz Andy Aschwanden, pesquisador da instituição. //
tomado de correio brasiliense
No hay comentarios:
Publicar un comentario