Médicos começam a discutir abordagens que ajudem a evitar o
surgimento da doença autoimune. A expectativa é de que, em um futuro próximo,
indivíduos com perfil de alto risco possam ser assistidos
PO Paloma Oliveto
(foto: Fernando
Lopes/CB/D.A Press)
Há pouco mais de 15 anos, receber o diagnóstico de artrite
reumatoide significava, para o paciente, uma vida de dor, deformidades, perda
de produtividade e limitações. Hoje, a doença permanece grave, mas
conhecimentos aprofundados dos mecanismos que a conduzem — o que levou ao
aprimoramento da abordagem terapêutica — permitiram que, em um intervalo curto
de tempo, os prognósticos melhorassem significativamente.
Embora já seja possível atingir a remissão da doença e
minimizar ou até evitar as comorbidades, ainda assim, 60% dos pacientes não
respondem à medicação adequadamente. A mortalidade de pessoas com artrite
reumatoide também é maior, comparada a quem não sofre dessa condição autoimune.
É por isso que, além de insistir na necessidade de diagnosticar e tratar
precocemente, o que retarda a evolução dos sintomas, os médicos começam a
discutir a prevenção da doença reumática.
A ideia é que, em um futuro próximo, quem tem perfil de alto
risco seja submetido a exames que detectam anticorpos e outras substâncias
associadas à artrite reumatoide e possa receber intervenções para evitar que
ela se manifeste. As possibilidades de prevenir a enfermidade foi tema de uma
edição especial da revista Clinical Therapeutics, da editora
Elvesier, na mesma semana em que se realizou, em Madri, o Congresso Europeu de
Reumatologia.
A artrite reumatoide é uma doença autoimune, quando o corpo
passa a atacar as próprias células por não reconhecê-las como parte dele mesmo.
Esse processo está presente em todas as pessoas e é importante para varrer do
organismo células defeituosas que são produzidas diariamente. Porém, no caso
dos pacientes, mesmo as saudáveis são consideradas inimigas e combatidas por
conjuntos do sistema imunológico.
Sinais precoces
Hoje, se sabe que, ao menos cinco anos antes de a doença
sintomática de fato se instalar, há produção aumentada de algumas substâncias,
detectáveis na corrente sanguínea. “A maior parte das doenças autoimunes só é
identificada uma vez que o indivíduo fica ‘doente’. Por exemplo, com a artrite
reumatoide, quando a pessoa sente dor e tem inchaço nas articulações”, diz o
médico Tsang Tommy Cheung, professor de medicina da Universidade de Hong Kong e
um dos editores convidados da revista.
“Exames de sangue podem, agora, identificar aqueles em alto
risco antes que se sintam doentes, abrindo um horizonte totalmente novo de
triagem e possível prevenção. Tratar a artrite reumatoide muito precocemente
pode permitir terapias mais baratas e seguras porque, quando a doença se
desenvolve em toda sua forma, tipicamente precisamos de medicamentos muito
poderosos para controlá-la”, explica o especialista.
Na edição especial da Clinical Therapeutics, pesquisadores
sugerem a realização de estudos clínicos para avaliar se, uma vez identificados
os pacientes em alto risco, sejam feitos testes com medicamentos usados hoje
para tratar a doença já instalada, com objetivo de verificar se a estratégia
pode evitar ou atrasar o desenvolvimento da artrite reumatoide. Eles destacam
que, antes de transformar a prevenção em prática clínica, é preciso avaliar se
os benefícios serão maiores que os riscos, já que todo remédio tem efeitos
colaterais.
O reumatologista Levi Jales Neto, da Rede de Hospitais São
Camilo, de São Paulo, afirma que alguns estudos-pilotos europeus já avaliaram o
tratamento com imunossupressores antes da fase sintomática em pessoas
predispostas e com anticorpos presentes. Porém, ele diz que os resultados foram
insuficientes para se estabelecer um protocolo clínico. “Os estudos tiveram
como resultado o início mais tardio da doença. Mas, por submeter as pessoas a
riscos de efeitos adversos da medicação, essa estratégia não é utilizada na
prática clínica atual.”
"Exames de sangue podem, agora, identificar aqueles em
alto risco antes que se sintam doentes, abrindo um horizonte totalmente novo de
triagem e possível prevenção”, Tsang Tommy Cheung, professor de medicina
da Universidade de Hong Kong // TOMADO
DE CORREIO BRAZILIENSE
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