Apesar de as novas variantes do Sars-CoV-2 reduzirem potencialmente a eficácia dos anticorpos, estudo mostra que elas não alteram a capacidade das células T de enfrentarem o vírus causador da covid-19 em pessoas vacinadas e recuperadas
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Paloma Oliveto
(crédito: Daniel Leal-Olivas/AFP)
Vírus estão sempre em mutação, mas, durante quase um ano, o
acúmulo dessas alterações não pareceu aumentar o potencial infeccioso ou a
letalidade do Sars-CoV-2. Até que foram detectadas variantes de rápida
disseminação no Reino Unido (B.1.1.7), no Brasil (P.1) e na África do Sul
(B.1.135), principalmente. A grande preocupação dos cientistas é saber se elas
podem afetar as estratégias que têm sido usadas para prevenir ou tratar a
covid-19.
Enquanto testes com as vacinas disponíveis indicam que os
anticorpos produzidos em resposta a elas conseguem neutralizar as novas cepas —
embora com eficácia reduzida no caso sul-africano —, ainda não se havia
investigado a interação das mutações que estão presentes nessas variantes e
outro importante componente do sistema imunológico: as células T, que eliminam
as células infectadas. Um estudo norte-americano traz uma perspectiva
animadora: o trabalho desses soldados imunológicos não parece afetado pelas variantes.
Divulgada na plataforma de pré-publicação (ainda não
revisada pelos pares) bioRXiv, uma pesquisa da Universidade da Califórnia
estudou a resposta de dois tipos de células T — a CD4 e a CD8 — às variantes do
Brasil, do Reino Unido e da África. O estudo, que utilizou soro convalescente
de pacientes que se recuperaram, assim como amostras de pessoas vacinadas com o
imunizante da Pfizer ou da Moderna, concluiu que as novas cepas não interferem
na capacidade de esses agentes do sistema imunológico lutarem contra o
Sars-CoV-2.
Os autores explicam que há grande preocupação com a
interferência das variantes na produção de anticorpos porque algumas pesquisas
sugerem que as novas cepas reduzem o potencial dessas substâncias de responder
às vacinas. Mas os anticorpos não são os únicos soldados imunológicos: enquanto
eles se acoplam diretamente aos vírus para torná-los inofensivos, as células T
reconhecem fragmentos de proteínas virais nas células infectadas e,
posteriormente, as matam para interromper a produção do vírus. Portanto, mesmo
que os Sars-CoV-2 mutantes enfraqueçam os anticorpos, a eficácia dos
tratamentos pode ser assegurada pelo bom funcionamento das células T.
“Os dados fornecem algumas notícias positivas à luz da
preocupação justificada sobre o impacto das variantes do Sars-CoV-2 nos
esforços para controlar e eliminar a atual pandemia. Sem dúvida, muitas das
variantes estão associadas ao aumento da transmissibilidade e também à
diminuição da suscetibilidade a anticorpos neutralizantes de indivíduos
infectados ou vacinados”, conclui a autora correspondente, Alba Grifoni, do
Centro de Doenças Infecciosas e de Pesquisa de Vacinas do Instituto La Jolla de
Imunologia, na Universidade da Califórnia.
Por outro lado, afirma, o estudo demonstrou que as células T
não são afetadas pelas mutações. “Assim, a resposta celular pode contribuir
para limitar a gravidade da covid-19 induzida por variantes que, parcialmente
ou amplamente, escapam de anticorpos neutralizantes.”
Anticorpos
Nos Estados Unidos, uma equipe da Faculdade de Medicina da
Universidade de Washington em St. Louis sugere que as novas variantes — do
Brasil, do Reino Unido e da África do Sul — reduzem a proteção conferida por
vacinas ou pela infecção prévia pelo Sars-CoV-2. A pesquisa, publicada ontem na
Nature Medicine, se refere à capacidade de os anticorpos reconhecerem e
neutralizarem o vírus. Segundo os autores, à medida que essas cepas se tornarem
dominantes, mais anticorpos serão necessários para enfrentá-las.
Os autores, porém, não sugerem que as vacinas não funcionam
— apenas que serão necessárias adaptações para enfrentar variantes. “Não
sabemos exatamente quais serão as consequências dessas novas cepas”, disse, em
nota, o autor sênior, Michael S. Diamond. “Os anticorpos não são a única medida
de proteção; outros elementos do sistema imunológico podem ser capazes de
compensar o aumento da resistência aos anticorpos. Isso será determinado ao
longo do tempo, epidemiologicamente, à medida que vemos o que acontece enquanto
essas variantes se espalham.”
O estudo baseia-se em experimentos em laboratório e foi
feito com as novas variantes mais preocupantes: do Reino Unido, da África do
Sul e do Brasil. Os pesquisadores testaram as cepas contra anticorpos no sangue
de pessoas que se recuperaram da infecção ou foram imunizadas com a vacina
Pfizer. Também testaram anticorpos no sangue de camundongos, hamsters e macacos
que foram vacinados com uma vacina experimental desenvolvida na Universidade de
Washington, que pode ser administrada pelo nariz. Em ambos os casos, a cepa
britânica foi neutralizada com níveis de anticorpos semelhantes aos necessários
para combater o vírus original. Mas as outras duas exigiram de 3,5 a 10 vezes
mais anticorpos para a neutralização.
Complicações cerebrais a longo prazo
Um estudo de revisão conduzido pela Universidade de Oxford
Brookes descobriu que uma grande proporção de sobreviventes da covid-19 será
afetada por complicações neuropsiquiátricas e cognitivas. Psicólogos da
instituição e um psiquiatra da Fundação NHS Trust avaliaram diversas pesquisas
sobre o tema a fim de entender mais sobre os possíveis efeitos da infecção pelo
Sars-CoV-2 no cérebro e até que ponto os pacientes recuperados podem esperar
apresentar problemas de saúde mental de curto e longo prazos.
A equipe descobriu que, em curto prazo, uma ampla gama de
problemas neuropsiquiátricos foi relatada. Em um estudo avaliado, 95% dos
pacientes com covid-19 clinicamente estáveis apresentaram transtorno de
estresse pós-traumático (TEPT), enquanto que outros trabalhos constataram que
entre 17 % e 42% dos pacientes experimentaram transtornos afetivos, como
depressão.
Os principais problemas cognitivos de curto prazo foram:
atenção prejudicada (relatado por 45% dos pacientes) e memória prejudicada
(entre 13% e 28%). A longo prazo, as disfunções neuropsiquiátricas foram,
principalmente, transtornos afetivos e fadiga, bem como atenção prejudicada
(44%) e memória (de 28% a 50% dos pacientes).
Monitoramento
Os autores dizem que é provável que haja um aumento de
pacientes com problemas psiquiátricos e cognitivos que eram saudáveis antes da
infecção. “A avaliação cognitiva detalhada e o monitoramento robusto dos
pacientes devem ser considerados para detectar novos casos neurológicos”,
alerta Kumar. “Isso também permitirá que os profissionais de saúde planejem
recursos e cuidados de saúde adequados e melhorem a qualidade de vida de muitos
sobreviventes da covid-19.”
As conclusões vão ao encontro de uma pesquisa do Instituto
do Coração (Incor) que, até agora, acompanhou 430 pacientes. Os resultados
indicam que, em 80% dos participantes, o coronavírus ocasiona dificuldade de
concentração ou atenção, perda de memória ou dificuldade para se lembrar das
coisas, problemas com a compreensão ou o entendimento, dificuldades com o
julgamento e raciocínio, habilidades prejudicadas, problemas na execução de
várias tarefas, mudanças comportamentais e emocionais, além de confusão mental.
Tomado de correio brasiliense
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