Estudo aponta que dragagem é responsável pela
deposição de lama na praia do Cassino
Foto: Fabio
Dutra Estudo aponta que dragagem é responsável pela deposição de lama na praia
do Cassino
Última ocorrência de lama na praia aconteceu em maio deste ano.
O professor
Lauro Calliari, do Núcleo de Oceanografia Geológica da Furg, encaminhou ao
Ministério Público, há algumas semanas, um parecer solicitado pela promotoria
sobre um documento que trata da deposição de lama na praia do Cassino. Este
parecer indica a influência da dragagem no processo de deposição recorrente da
lama bem como apresenta uma evidência importante já detectada anteriormente, de
que a lama depositada em abril e maio deste ano foi causada pelas dragagens
recentes. "A lama depositou-se em decorrência de sedimentos lançados
dentro do estuário (no caso, a dragagem
do canal Miguel da Cunha) como também pelo processo associado às dragagens
maiores realizadas posteriomente e lançadas no oceano", destacou.
Segundo
Calliari, a análise da lama indicou a ocorrência elevada de gastrópode Heleobia
autralis (caramujo da lama). Essa evidência, de acordo com o professor, é um
indicador biológico importante pois esse tipo de caramujo vive na lama do
estuário e sua presença só foi registrada na praia depois das dragagens.
"Vários estudos de detalhe da fauna dos organismos que vivem no fundo, em
frente ao Cassino, efetuados em toda a história da Furg, nunca encontraram um
exemplar de Helióbia australis. E, de repente, esse organismo aparece aos
milhares em pouco volume de lama analisado".
"No
caso atual, as dragagens foram efetuadas em 2013 e 2014 (finalizada em janeiro
). Essa dragagem formou muita lama fluída num curto espaço de tempo. Notou-se
na praia a partir de fevereiro, março e abril a ausência de ondas na zona de
arrebentação, indício de que a lama fluída depositou-se e junto com ela os
gastrópodes", destacou. Calliari explicou que a lama ficou e fica
depositada no mar até chegarem as tempestades de abril (início das grandes
tempestades na costa do RS). "Essas tempestades têm energia para
remobilizar a lama fluída e jogá-la na praia", ressaltou.
Ocorrência desde 1998
A ocorrência
de lama na praia esse ano é uma repetição do que aconteceu em 1998, enfatizou
Calliari. "Naquela ocasião, os sedimentos dragados foram jogados dentro do
estuário e na zona costeira próxima ao molhe leste (profundidade de 12 metros).
Em 1998, os produtos de dragagem foram descartados dentro do estuário e também
em profundidades rasas (12 metros), no oceano, explicou, destacando ainda que
como resultado dessa ação, ocorreu o maior impacto já registrado no Cassino de
lama fluída depositada desde o Terminal Turístico até quase o Navio Altair. O
processo gerou efeitos que perduraram por muito tempo, ficando a praia sem zona
de arrebentação por mais de 14 meses.
A análise do
processo todo vem sendo feita há muito tempo, destacou o professor da Furg,
enfatizando que existem dados sedimentológicos e hidrodinâmicos das tempestades
que já foram registrados em diversos relatórios encaminhados ao Ministério
Público e aos orgãos ambientais Estadual e Federal. Calliari garante que a
presença de helióbia como indicador é conclusiva. "É um indicador
importante que nunca foi encontrada fora destes episódios. Essa evidência só
havia sido detectada na praia e longe da costa (alguns exemplares) justamente
em 1998, ano do grande impacto. Junto
com a Helióbia, os padrões de sedimentação na zona costeira mudam, e quando
comparados com os padrões normais, são completamente diferentes",
ressaltou.
Quando
questionado a Calliari, se a dragagem está sendo feita de forma incorreta e se
o local onde está ocorrendo a deposição da lama dragada é impróprio para tal
fim, o professor explicou que a produção excessiva de lama fluída num curto
espaço de tempo pode indicar duas coisas:
O processo
de dragagem em si pode estar gerando a lama fluída; ou o sítio de despejo no
oceano pode não ser apropriado. "Não posso afirmar que não foi depositado
a 19 metros de profundidade, porque eu não acompanhei o monitoramento do
processo. Entretanto, sei que os produtos da dragagem do Canal Miguel da Cunha
(realizada de 14 de dezembro/2013 a 14 de janeiro/2014) foram lançados dentro
do estuário. Temos registros fotográficos disso", garantiu Calliari,
analisando ainda que mesmo sendo volumes menores, eles nunca deveriam ter sido
lançados dentro do estuário. "Já fizemos vários relatórios desaconselhando
essa prática danosa, proibida em todos os estuários do mundo. O lançamento
dento do estuário acaba indo parar no Cassino", reforçou.
"O
processo de dragagem tem que ser monitorado principalmente no que tange à
concentração de sedimentos em suspensão. O monitoramento da qualidade da água
feito atualmente também é importante mas não é suficiente para o problema da
lama. O sítio de despejo também deve ser
monitorado
com traçadores artificiais - prática que já é usada há anos em vários países
", aponta como solução Calliari, explicando ainda que essa técnica já é
dominada por algumas instituições no Brasil, tendo inclusive já sido
demonstrado o seu potencial aqui no nosso porto para administrações anteriores.
"Temos que ter certeza que os sedimentos não voltam para a praia. Esses
traçadores são lançados junto com a lama descartada e o seu movimento pode ser
seguido por equipamentos especiais".
Outro
aspecto apontado como solução pelo professor é a utilização da draga
"Sebastian Del Cano", caracterizada por ele como draga ecológica.
"Ela já foi utilizada na dragagem de um dos maiores volumes de sedimentos
já dragados no Porto sem ocasionar impacto" e também lançou os sedimentos
no oceano. A dragagem é imperativa e fundamental para o nosso porto, mas não
podemos dar margem a esse impacto recorrente na nossa praia, tão prejudicial ao
ambiente, à segurança do banho de mar e de quem trafega pela orla, bem como ao
turismo.
Calliari
concluiu a entrevista revelando que, até analisar as planilhas de dragagem dos
últimos 60 anos, acreditava que o processo de deposição da lama era natural.
"Mas voltei atrás depois de analisar as planilhas de dragagem e despejo do
material bem como dados sedimentológicos obtidos de estudos de detalhe
realizados em 2005", concluiu.
Os aspectos
mais técnicos relativos ao problema de deposição de lama na praia do Cassino
podem ser obtidos através de
Posição Suprg
Em nota
encaminhada à redação, a Superintendência do Porto do Rio Grande (Suprg)
informou que a realização de dragagem possui autorização do Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). "A
Superintendência solicita ao órgão ambiental uma aprovação prévia do local de
descarte dos sedimentos de dragagem. Além disso, durante o período de dragagem,
uma equipe da Divisão de Meio Ambiente, Saúde e Segurança (Dmass) do Porto,
realiza semanalmente o monitoramento da qualidade da água, de acordo com o
programa estabelecido e aprovado pelo Ibama, e outra equipe técnica da Suprg
acompanha a dragagem em período integral". Ainda de acordo com a nota, a
última dragagem no canal de acesso ao Porto foi finalizada em janeiro de 2014.
"Atualmente, sabe-se que a lama na beira da praia, no balneário Cassino,
trata-se de um processo natural de formação de um bolsão de lama. Dependendo
das condições climáticas, dos ventos, das correntes e das chuvas, essa lama é
liberada na beira da praia. Este é um acontecimento mais comum nos anos em que
há maior incidência de chuvas".
A nota da
Suprg enfatiza ainda que, até o momento, não há estudo que comprove a relação
da dragagem com o acúmulo de lama na praia do Cassino. "Para obter um
parecer oficial, a Suprg contratou estudo técnico que possibilite o embasamento
sobre o assunto".
Por Eduarda
Toralles – TOMADOD E AGORA DE RGS BR
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