jueves, 24 de enero de 2019

CIENTISTAS USAM MATEMÁTICA PARA PRESUMIR COMPORTAMENTO DE MULTIDÕES


Cientistas usam matemática para presumir comportamento de multidões
Princípios que regem o estudo de fluídos podem ser usados para prever o comportamento de grandes grupos de pessoas, segundo pesquisadores franceses. Em testes, a fórmula criada pela equipe funciona bem analisando maratonas
VS Vilhena Soares
Corredores na Maratona de Paris de 2017: segundo os autores, é mais fácil alterar a velocidade do fluxo de pessoas do que a trajetória delas(foto: Eric Feferberg/AFP - 9/4/17)
A direção que uma maratona ou uma manifestação vai tomar ao longo de seu percurso pode ser prevista matematicamente, segundo cientistas franceses. Os pesquisadores chegaram a essa conclusão após analisar o movimento coletivo de participantes de corridas de rua em diversas cidades. O comportamento relacionado à rota de aglomerações dialoga com princípios baseados na teoria hidrodinâmica, garantem os autores. Eles sugerem o uso preditivo dessas informações, o que poderia ajudar no gerenciamento de grandes grupos em situações variadas, de procissões a tragédias naturais.
De acordo com os autores do estudo, publicado na revista Science, nos últimos 10 anos, os físicos descreveram com sucesso o comportamento em larga escala de bandos de aves, cardumes e até de tecidos celulares. No entanto, matemáticos e físicos estabeleceram uma variedade de regras comportamentais apenas a nível individual. Nenhuma teoria preditiva foi desenvolvida para explicar o movimento de grupos humanos. “A principal razão dessa lacuna está na falta de experimentos com modelos quantitativos. Nosso objetivo era corrigir essa situação”, diz ao Correio Denis Bartolo, um dos autores do estudo e professor da Escola Superior de Lyon, na França.
No trabalho, Denis Bartolo e Nicolas Bain, também professor da faculdade francesa, ignoram agentes individuais. Em vez disso, tratam a multidão como uma entidade em si, a fim de estabelecer uma teoria hidrodinâmica do movimento humano em larga escala, completamente livre de pressuposições comportamentais, um dos pontos mais explorados por pesquisas anteriores. Em seus experimentos, a dupla observou grupos de corredores no início de uma maratona, enquanto eram guiados para a linha de partida por uma fila de organizadores com movimentos sucessivos de caminhada e parada. De acordo com os cientistas, esse “protocolo” cria um distúrbio periódico e controlado semelhante às estimulações usadas para investigar respostas mecânicas.
A análise foi feita inicialmente na Maratona de Chicago, nos Estados Unidos, e, depois, englobou eventos semelhantes em outras cidades, como em Paris e Atlanta. Com o uso de padrões técnicos da mecânica dos fluidos, os cientistas analisaram imagens de linhas de chegada de cinco grupos. Os pesquisadores mediram, com sucesso, a velocidade da multidão a cada instante, conseguindo descrevê-la posteriormente como um “fluxo de líquido”. Seus resultados mostram que informações sobre a velocidade se espalham sem perda de intensidade. Em contraste, qualquer mudança na trajetória de movimento da multidão se dissipa rapidamente.
Os pesquisadores também observaram que o comportamento do grupo varia muito pouco de um conjunto de corredores para outro e de um país para outro. A partir das constatações, a equipe conseguiu estabelecer uma fórmula para prever a movimentação da maratona de Paris de 2017 tendo como base os fluxos observados em uma corrida de rua realizada em Chicago, no ano anterior. “O que realmente nos surpreendeu foi a reprodutibilidade de nossas medições de um evento para outro. Em particular, a velocidade com que a informação sobre a velocidade se propagou através das multidões foi considerada idêntica em todas as cidades. Isso foi muito inesperado”, pontua Denis Bartolo.
Rio abaixo O cientista conta que a intenção da pesquisa não era uma aplicação a curto prazo dos resultados, mas ele reconhece que as informações podem ser bastante úteis. “Saber como a informação se propaga em multidões polarizadas é o primeiro passo para se estabelecer uma estratégia objetiva de controle de multidões que não dependa de observações empíricas ou argumentos heurísticos”, explica. “De uma perspectiva muito prática, nós estabelecemos que a melhor maneira de acelerar ou desacelerar o movimento polarizado da multidão é controlar sua velocidade a partir de suas laterais a jusante da massa, o que chamamos de direção rio abaixo. Tentar transmitir informações de velocidade sem utilizar essa tática seria absolutamente ineficaz”, frisa.
A pesquisa terá continuidade. Os físicos planejam estudar a resposta de aglomerados de pessoas a perturbações extremas. “Queremos observar como interações entre os indivíduos, como contatos físicos, interferem no fluxo. Essa situação também seria crucial para traçar estratégias quantitativas de gerenciamento de risco”, adianta Denis Bartolo.
Modelo promissor
Para Nicholas Ouellette, engenheiro civil e pesquisador da Universidade de Stanford, (EUA),  o estudo se destaca pelo método adotado. “Em vez de se concentrar nos indivíduos, eles construíram um modelo hidrodinâmico contínuo da multidão como um todo e, em seguida, restringiram, com dados observacionais coletados de maratonas, algo distinto de todos estudos que exploraram essa questão.”
Para o especialista, o trabalho dos cientistas franceses poderá servir de base para mais investigações que abordem o comportamento das massas. “O sucesso da abordagem de Bain e Bartolo abre muitos caminhos ou trabalhos futuros para os pesquisadores de comportamento coletivo em geral”, explica. “Esse é um resultado muito importante, inclusive para aqueles interessados em criar modelos baseados em situações perigosas, como o pânico da multidão”, complementou. // TOMADO DE CORREIO BRASILIENSE

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