Plasma de paciente curado reduz mortes por covid-19, diz
estudo americano
Primeiro estudo sobre o uso do plasma convalescente em
pacientes da covid-19 que compara a eficácia da técnica a um grupo de controle
mostra redução da mortalidade e do tempo de internação daqueles tratados com a
abordagem centenária
PO Paloma Oliveto
(foto: Lucas
Pacífico/CB/D.A Press)
Em 1890, uma publicação científica descreveu, pela primeira
vez, uma abordagem que já vinha sendo observada por cientistas. O microbiólogo
alemão Emil Behring relatou, na revista Deutsche Medicinishce Wochenschrift,
que animais infectados com difteria e tétano poderiam ser curados pelo sangue
de outros, saudáveis, que haviam se recuperado da mesma doença. Além de ajudar
a estabelecer as bases da vacina, o pesquisador apresentou evidências de uma
terapia que, mais de 100 anos depois, está sendo testada para enfrentar a
pandemia da covid-19.
Sem vacina nem medicamentos específicos disponíveis até
agora, médicos experimentam o tratamento com sangue convalescente para fazer
com que os pacientes desenvolvam anticorpos para o Sars-CoV-2, a partir do
plasma purificado de pessoas curadas da doença. Pequenos estudos de casos têm
demonstrado que a abordagem ajuda a eliminar o vírus mais rapidamente do
organismo, reduzindo o tempo de internação e a gravidade da covid-19.
Agora, cientistas da Faculdade de Medicina Icahn do Monte
Sinai, em Nova York, divulgaram os resultados de uma pesquisa na qual
compararam a eficácia do tratamento de pessoas submetidas à abordagem a de
pacientes que não receberam o plasma. É a primeira vez que, na pandemia atual,
usa-se um grupo de controle para avaliar essa terapia.
De acordo com o artigo, divulgado na plataforma online de
pré-publicação científica medRxiv, os pacientes internados no Hospital
Universitário Monte Sinai que receberam plasma convalescente tiveram sobrevida
maior e apresentaram melhora na oxigenação comparados a um grupo de
hospitalizados não submetidos ao tratamento. Contudo, mesmo que o estudo tenha
usado a metodologia considerada padrão-ouro das pesquisas científicas — isto é,
pacientes em grupos passíveis para comparação —, os autores observam que, no
caso daqueles que não receberam o plasma, os dados foram obtidos
retrospectivamente — eles não foram acompanhados ao mesmo tempo das pessoas que
passaram pelo tratamento experimental.
Os dados do estudo norte-americano — primeiro país, depois
da China, a testar o plasma convalescente em pacientes de covid-19 —,
referem-se a 78 infectados pelo Sars-CoV-2. Trinta e nove deles receberam cerca
de 500ml de sangue. Os relatos são preliminares, pois os testes continuarão a
ser feitos, com números maiores de participantes.
Seleção
Nicole Bouvier, professora da Faculdade de Medicina Ichan e
coautora do artigo, explica que as informações do grupo de controle foram
obtidas por um algoritmo que fez a seleção dos pacientes nos prontuários
disponíveis pelo Sistema de Saúde da cidade de Nova York, uma das primeiras e
mais atingidas pela epidemia nos Estados Unidos. De acordo com ela, o programa
buscou pessoas infectadas pela covid-19 com características semelhantes às das
que participaram ativamente do estudo, como idade, comorbidades, necessidade de
oxigenação suplementar e etc.
Todos os participantes, inclusive os do grupo controle,
precisaram de oxigenação no primeiro dia de internação. Sessenta e nove por
cento receberam o oxigênio de baixo fluxo (por máscara ou cateter no nariz) e o
restante por ventilação mecânica invasiva (respirador).
No 14º dia, as condições clínicas pioraram em 18% dos
pacientes com plasma e 24,3% dos controles. Nos dias 1 e 7, o grupo plasmático
também mostrou uma redução na proporção de internos com piora do estado de
oxigenação, mas essa diferença não foi estatisticamente significativa. Em 1º de
maio, ao fim de duas semanas de estudo, 12,8% dos receptores de plasma e 24,4%
dos pacientes controle haviam morrido; e 71,8% e 66,7%, respectivamente, recebido
alta.
“Estamos confiantes de que nossa avaliação inicial tenha
fornecido evidências em apoio ao plasma convalescente como uma intervenção
eficaz”, afirma Nicole Bouvier. De acordo com ela, aparentemente os pacientes
menos graves tendem a se beneficiar mais do tratamento, algo que deve ser
confirmado em estudos futuros. “São necessárias pesquisas adicionais para
confirmar esses dados, para tirarmos conclusões mais definitivas em diferentes
populações”, destaca.
Embora centenária, essa terapia ainda não foi testada em um
grande número de pacientes, seguindo a metologia padrão ouro dos estudos
científicos. Uma dificuldade para isso, segundo especialistas, é a alta
mortalidade em tempos de epidemias de doenças infecciosas, quando, para salvar
vidas, os médicos têm de lançar mão dos tratamentos com eficácia conhecida, em
detrimento de randomizar pacientes em grupos comparativos.Continua depois da
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Influenza
Um dos maiores trabalhos científicos sobre o plasma
convalescente em termos numéricos foi realizado no ano passado por uma equipe
de pesquisadores norte-americanos, financiada pelo Instituto Nacional de
Alergias e Doenças Infecciosas dos EUA, o Niaid.
Cento e quarenta crianças e adultos com influenza foram
divididos aleatoriamente em dois grupos, sendo que metade recebeu plasma
convalescente com altos níveis de anticorpos virais, e metade o placebo, que
consistiu em sangue sem anticorpos. O estudo foi duplo-cego: nem médicos nem
pacientes sabiam quem era receptor do tratamento verdadeiro.
O artigo, publicado na revista médica The Lancet, concluiu
que não houve benefícios para aqueles que receberam o plasma convalescente. O
vírus testado, porém, foi o influenza A, que não pertence à mesma família do
Sars-CoV-2.
Na época das epidemias de Sars e Mers, coronavírus
semelhantes ao causador da covid-19, pequenos estudos indicaram melhora dos
receptores de sangue convalescente, com presença comprovada por testes de
anticorpos circulantes no organismo. Recentemente, um estudo com macacos rhesus
mostrou que os animais tratados com essa abordagem eliminaram o micro-organismo
mais rapidamente e, quando colocados em contato novamente com o Sars-CoV-2, não
foram reinfectados.
Há poucos trabalhos sobre os efeitos dessa terapia em
humanos durante a pandemia atual. Geralmente, as publicações são estudos de
casos. No início do mês, pesquisadores indianos fizeram uma compilação da
literatura disponível e encontraram bons resultados. O artigo foi publicado no
Journal of Medical Virology.
Para a pesquisa, os autores buscaram nos indexadores de
estudos científicos artigos sobre o uso do plasma convalescente na pandemia da
covid-19. Eles encontraram cinco artigos que, juntos, envolveram 27 pacientes.
Quatro foram realizados na China e um na Coreia do Sul. Vinte e um
hospitalizados eram considerados críticos quando admitidos nas Unidades de
Terapia Intensiva, e 14 dependiam de respiradores. Dezessete foram
diagnosticados com a síndrome do estresse respiratório agudo, a fase mais grave
da covid-19.
“Todos os cinco estudos constataram que a terapia com plasma
convalescente reduziu, significativamente, a carga viral e aumentou o nível de
anticorpos neutralizadores ao longo tempo”, escreveram os autores. “Depois de
receberem a transfusão, quase todos os pacientes mostraram melhoras nos
sintomas, incluindo normalização da temperatura corporal, absorção das lesões
pulmonares em graus variados, cura da síndrome e dispensa da ventilação mecânica
entre um a 35 dias após a transfusão.” Os autores observaram que nenhum dos
cinco estudos foram randomizados, com grupos de placebo para comparação.
Porém, como os efeitos colaterais do tratamento são
basicamente nulos, alguns especialistas defendem o uso do plasma convalescente
nos pacientes da covid-19. É o caso de Foad Alzoughool, pesquisador da
Universidade de Hashemite, em Amsterdam. Ele estudou a imunização passiva em
epidemias anteriores, como de ebola, chicungunha e H1N1, e afirma que as evidências
da eficácia desse tratamento são convincentes. “O uso de plasma dos pacientes
recuperados pode ser útil na guerra mundial contra a covid-19”, acredita.
De acordo com ele, especialmente quando a transfusão é feita
logo após os primeiros sintomas, o tempo de internação é “significativamente
mais baixo” e a mortalidade é menor, comparado a pessoas com características
semelhantes, que não receberam esse tratamento. “Se estamos buscando terapias
para a covid-19, vamos encontrá-la no sangue dos sobreviventes. Em uma época na
qual não há nenhuma droga antiviral nem vacina para essa doença, a imunização
passiva pode ajudar a frear o vírus letal e salvar vidas, particularmente de
idosos e pacientes com comorbidades”, diz.
Pesquisas no Brasil
Atualmente, há mais de 140 projetos mundiais para uso da
terapia com plasma convalescente em pacientes de covid-19 e ao menos 60 estudos
em andamento. No Brasil, o tratamento experimental está em curso no Hemocentro
do Pará, no Hemorio (RJ) e em uma parceria do Hospital Israelita Albert
Einstein, do Hospital Sírio Libanês, da Universidade de São Paulo e da
Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, todos em São Paulo. Ainda não há
resultados publicados desses estudos, que estão sendo acompanhados pelo
Ministério da Saúde. // tomado de
correio brasiliense
nota: se utilizo desde los años 1960 en argentina para sanar pacientes de fiebre hemorragica (mal de los rastrojos)
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