Muito além da lama
Excesso de lama, mudança da vegetação, diminuição da
fauna e grandes quantidades de lixo alteram o cenário e a saúde da Praia do
Cassino
Fábio Dutra
Lama é encontrada em algumas áreas da praia
É notório, que nos últimos anos, em algumas áreas, a praia
do Cassino ganhou novas características. Entre elas, e principalmente, estão a
grande concentração de lama e a vegetação que cresceu na orla. Além
disso, outras alterações ocorreram, tendo vários fatores contribuído para tais
mudanças.
O fator de maior relevância é a questão da lama, que começou
a surgir com frequência nas últimas duas décadas e que, atualmente, é
responsável por uma alteração sem precedentes da paisagem na faixa de praia
entre os molhes de Barra e a estátua de Iemanjá, estendendo-se ainda por pontos
na direção da Querência.
Entre as possíveis causas apontadas da deposição da lama
estão as constantes dragagens do canal do porto, a força da corrente
ocasionada pelo prolongamento e estreitamento dos molhes - o que acaba levando
maior quantidade de sedimentos da Lagoa dos Patos ao oceano - ou, ainda,
um processo natural. Porém, independentemente das causas do fenômeno, o que
chama a atenção são os grandes bolsões de lama que atingem diretamente a faixa
de praia mais frequentada por banhistas e por praticantes de esportes
náuticos.
Com 126 anos, o Cassino é considerado o balneário marítimo
mais antigo do Brasil (1890). A faixa de praia utilizada por banhistas há mais
de um século, no entanto, perdeu as características, deixando, inclusive, de
ser atrativa aos veranistas locais e aos milhares de turistas que a visitam
anualmente. Hoje, as tradicionais caminhadas ou pedaladas, da parte
"central" da praia aos molhes da Barra, são praticamente impossíveis.
Além da lama, uma vegetação formou-se à beira-mar em alguns pontos, mudando
bastante a paisagem tão característica dessa faixa litorânea. Circular pela
orla é quase um desafio e são inúmeros os casos de veículos que acabam
atolados.
No entanto, a lama e a inusitada vegetação que surgiu
à beira da praia não são os únicos sinais do impacto que a orla sofre. De
acordo com Lilian Brum Wetzel, mestre em Engenharia Ambiental (Planejamento de
Bacias Hidrográficas) e técnica executora dos projetos Dunas Costeiras e
Tartarugas Marinhas, do Núcleo de Educação e Monitoramento Ambiental (Nema), um
dos principais problemas causadores de grandes impactos ambientais na orla é o
lixo deixado pelos seus frequentadores. Ela conta que o Nema possui projetos, os
quais trabalham no estudo e no monitoramento de praia e dunas.
"O projeto Dunas Costeiras monitora a praia e as dunas
e também os impactos antropogênicos causados pelo homem e, ainda, como a praia
está sendo usada", explica. Conforme Lilian, o Nema possui convênios com a
Prefeitura do Rio Grande, os quais possibilitam que esses projetos sejam
executados. "O Nema presta uma assessoria técnica, em que são realizadas
muitas atividades de educação ambiental. Essas atividades têm como objetivo
fazer com que a comunidade se sinta mais responsável pela praia", destaca.
Ela diz que sempre que os integrantes do Nema identificam um
caso de crime contra o meio ambiente, em alguma das áreas da praia ou das
dunas, é feito um registro e encaminhado ao Executivo Municipal. "Nós
encaminhamos as denúncias, pois não temos poder de polícia. Sempre encaminhamos
em forma de denúncia", esclarece. Ela salienta que além do encaminhamento,
o Nema faz relatórios técnicos que são encaminhados à prefeitura.
Espécies em extinção e o lixo
A integrante do Núcleo de Educação e Monitoramento Ambiental
conta que as lagartixas e os tuco-tucos das dunas são espécies em extinção. Ela
comenta que um dos fatores que ameaçam estas espécies é o de que cães em
situação de rua cavam muito nas áreas das dunas, o que acaba desestabilizando a
área. Além disso, outro fato que contribui é o lixo que é jogado no local.
Lilian lembra que muitas tartarugas que são encontradas mortas, muitas vezes, é
em função do lixo que consumiram. Diz ainda que, atualmente, o número de aves
que vêm se alimentar na orla diminuiu em razão da redução de alimentos.
Ela informa que o lixo chega à praia e às dunas, ou por meio
dos frequentadores, que não dão o destino final adequado aos resíduos, ou,
ainda, podem ter origem da lagoa ou de embarcações. "A nossa grande
campanha é para as pessoas trazerem para si a responsabilidade de carregar o
seu lixo, de elas serem responsáveis pelo lixo que produzem. Toda a área da
praia e das dunas precisa ser protegida por todos nós. Nós temos que parar de
tratar a nossa praia como um balneário de verão", enfatiza.
Nova vegetação
A integrante do Nema explica que a nova vegetação que está
surgindo na praia pode ser em razão dos eventos de deposição de lama.
"Houve a formação de condições propícias para o desenvolvimento de
vegetação. A lama oferece fertilidade. Não temos avaliações da vegetação
encontrada ali", ressalta. Ela comenta que no momento em que estas
vegetações se formam, elas se tornam Áreas de Preservação Permanente (APPs) e
não podem ser danificadas. "Aquela vegetação na praia, as 'neodunas' que
estão se formando vão receber a tutela legal e não poderão ser retiradas dali
pelo homem. Pode acontecer de, futuramente, a vegetação receber uma camada de
barro por cima", salienta.
Lilian explica que, hoje, o grande desafio por parte das
autoridades é mudar o comportamento das pessoas. "As pessoas devem fazer a
parte delas. Se todo mundo se mexer, mudar as atitudes, é possível resgatar a
beleza do Cassino, mas é preciso mudar", aponta. Ela lembra que é preciso
transformar a população em defensora da praia. "Com certeza, a lama
modificou a praia e não sabemos até que ponto, mas temos um 'tantão' de praia
saudável, que depende de cada um de nós", reforça.
Executivo Municipal
Segundo o secretário de Município do Cassino, Miguel Satt,
os índices de lixo encontrados já foram reduzidos, no entanto, é preciso
melhorar. "Os verdadeiros culpados somos nós (seres humanos). Nós somos os
maiores produtores de lixo. Os índices melhoraram muito. As campanhas
educativas têm gerado muito efeito. Na realidade, tudo isso é em decorrência da
má educação", observa. O secretário, juntamente com o secretário-adjunto,
Denisson Herreira, explica que a secretaria possui a licença da orla da praia
apenas de março a dezembro, mas que, mesmo assim, durante o inverno, seguem
fazendo a manutenção para que a praia fique limpa.
O secretário de Meio Ambiente, Sandro Miranda, comenta que a
prefeitura tem quatro convênios com o Nema, e que um estudo preliminar está
sendo realizado sobre a possibilidade da criação de uma unidade de conservação
de uso sustentável das dunas da orla da praia. "As dunas, assim como a
própria praia, são áreas de APP que não podem ser alteradas. Com a criação
desta unidade de conservação será possível receber financiamento",
destaca.
Lei de proteção
Existem leis que protegem as Áreas de Preservação Permanente
(APPs), que segundo dados do Nema, são os espaços territoriais que, devido às
suas funções ambientais, devem ser permanentemente protegidos, por força do
Código Florestal (Lei Federal 12651/12) e do Código Estadual 11520/00). As
dunas também são consideradas APPs e patrimônio ambiental, cultural e
paisagístico do Município. De acordo com informações do Nema, a lei proíbe
expressamente que nas dunas do Rio Grande sejam realizadas atividades de
pastagem de animais, trânsito de veículos motorizados, mineração, depósito de
resíduos e construções. Além disso, a lei diz que quem degradar ou causar danos
às dunas será penalizado, independente da obrigação de recuperar dano ecológico
e sem prejuízo de outras penalidades legais. Quem realiza este tipo de crime
contra o meio ambiente fica sujeito à multa simples ou diária, embargo e/ou
demolição ou prestação de serviços à comunidade (Lei Municipal 5261/98).
O que deve ser feito
- Usar as dunas dentro dos limites permitidos e denunciar
quem está infringindo a lei;
- Ser responsável pelos resíduos que produz e dar a eles o
destino adequado - mesmo que não pareçam lixo; - Sempre que possível, utilizar
a passarela sobre as dunas ou os acessos já existentes;
- Ser consciente na guarda dos animais domésticos, cuidando
para que não andem soltos pela faixa de prais e nas dunas; - Jamais retirar
areia ou remover vegetação das dunas;
- A caminho da praia, trocar o carro ou a motocicleta pela
caminhada ou bicicleta;
- Reduzir os ruídos, baixar o volume da voz e valorizar o
silêncio, com isso, a beleza do ambiente poderá ser apreciada e
conservada.
Por Aline Rodrigues TOMADO DE AGORA DE RGS BR
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