Duas pesquisas trazem novidades que poderão ajudar a conter a disseminação do Sars-CoV-2. Em um dos experimentos, a vacina da Moderna gera anticorpos por até 90 dias. Em outro, uma droga de aplicação simples reduz a carga do vírus em infectados
Vilhena Soares
(crédito: AFP / Sakis
MITROLIDIS)
Enquanto os países começam a divulgar calendários de
vacinação, surgem mais avanços científicos que poderão ajudar no combate à
covid-19. Duas pesquisas divulgadas ontem mostram ganhos significativos na área
de controle da transmissão do Sars-CoV-2. Estudo divulgado no periódico New
England Journal of Medicine mostra que a vacina da empresa Moderna gera
anticorpos no organismo humano por até 90 dias. Já na revista Nature
Micriobiology, cientistas norte-americanos apresentam um medicamento para a
gripe que reduz a carga viral do novo coronavírus e diminuiu a
transmissibilidade da enfermidade em furões.
A equipe estadunidense explica que os remédios usados
atualmente para tratar a covid-19, como o remdesivir e o soro convalescente,
são inadequados no controle da transmissão comunitária do vírus. Isso porque
não podem ser administrados por via oral, o que dificulta o tratamento de um
número maior de pessoas. Os cientistas resolveram testar a eficácia do
medicamento MK-4482/EIDD-2801, com potencial para resolver os embates. “Esse
remédio pode ser administrado por via oral e ajudou a prevenir a transmissão do
vírus influenza em porquinhos-da-índia e em camundongos”, relatam os autores do
artigo, liderados por Richard Plemper, pesquisador da Universidade Estadual de
Geórgia.
Para avaliar melhor os efeitos da droga, furões foram
tratados com diferentes abordagens ao longo de três dias: receberam, duas vezes
ao dia, 5mg ou 15mg da droga cerca de 12 horas após serem infectados ou
receberam 15mg, 36 horas depois do contágio. Havia ainda um grupo de controle,
que não recebeu o medicamento. “O RNA da Sars-CoV-2 foi detectável nos tecidos
nasais de todos os animais, mas em quantidade significativamente reduzida nos
grupos tratados com a droga”, frisaram os cientistas.
Os autores também avaliaram se o medicamento poderia
suprimir a transmissão do vírus. Para isso, reuniram, em um mesmo alojamento,
animais saudáveis com furões que receberam a droga 12 horas após a confirmação
de infecção pelo Sars-CoV-2. Três dias depois, não foram detectadas, nos furões
saudáveis, partículas infecciosas do vírus. Isso mostra que o uso do
medicamento impediu que esses animais contaminassem os saudáveis, segundo os
cientistas.
Já quando animais infectados que não receberam o medicamento
foram postos no mesmo ambiente que cobaias saudáveis, todos os furões foram
contaminados. “É necessário frisar que a eficácia antiviral da
MK-4482/EIDD-2801 em humanos é desconhecida. No entanto, os resultados em
nossos experimentos indicam que esse medicamento pode ter o potencial de
bloquear a transmissão do Sars-CoV-2”, enfatizaram.
Adaptações
Victor Bertollo, médico infectologista do Hospital Anchieta
de Brasília, explica que os resultados obtidos são positivos, apesar de
bastante iniciais. “Esse medicamento testado pelo grupo pertence a uma classe
de remédios chamada análogos de nucleosídeo. Eles já se mostraram eficazes no
controle de outras enfermidades, como o HIV, porque conseguem bloquear uma
enzima responsável pela replicação desse vírus. Mas é importante ter cautela,
pois os testes foram feitos em animais”, afirmou. “O remédio também foi
administrado 12 horas depois do diagnóstico, mas, no nosso cotidiano, só vamos
tratar um paciente quando ele demonstrar os sintomas, e isso pode demorar para
acontecer.”
O especialista destaca também que, se o medicamento
experimental se mostrar eficaz em humanos, terá características importantes
para facilitar o combate à pandemia. “É um remédio de uso oral, o que facilita
o controle da transmissão da doença. Esse diferencial é importante porque
outros medicamentos, por serem intravenosos, são administrados apenas em
hospitais. Isso faz com que seja trabalhoso atingir um número maior de pessoas
e em pouco tempo, algo necessário para a diminuição do contágio. Outro ponto
importante é que é um tipo de terapia menos cara”, justificou.
"Imunidade durável"
À espera de autorização para o uso da fórmula para além dos
testes clínicos, a farmacêutica Moderna teve o efeito de sua vacina atestado em
uma revista científica. Um estudo divulgado na New England Journal of Medicine
mostrou que a fórmula gera anticorpos persistentes por 90 dias após a aplicação
da segunda dose. Os dados são provenientes da primeira fase de testes clínicos
do medicamento, e os participantes serão acompanhados por 13 meses para
verificar a imunidade a longo prazo.
“Recentemente, relatamos os resultados de um estudo de fase
um de uma vacina de RNA mensageiro (mRNA-1273) para prevenir a infecção por
Sars-CoV-2. Esses dados provisórios cobriram um período de 57 dias após a
primeira vacinação. Aqui, descrevemos os níveis de imunogenicidade 119 dias
após a primeira dose e 90 dias após a segunda”, detalharam, no artigo, os
cientistas.
No texto, eles relatam ainda que observaram uma diminuição
“leve” e esperada no nível de anticorpos em participantes vacinados, mas a um
grau que ainda permanece alto e acima da imunidade natural (que ocorre em
pacientes que foram infectados. “Esses resultados mostram que, apesar de um
ligeiro declínio esperado na quantidade de anticorpos neutralizantes, a
mRNA-1273 tem o potencial de fornecer uma imunidade durável”, ressaltaram.
A equipe pondera que novas análises precisam ser feitas para
entender melhor o efeito protetor da vacina, já que os anticorpos são apenas um
componente da resposta imunológica. Os responsáveis pela vacina também
informaram, no estudo, que nenhum efeito colateral grave foi observado em todo
o ensaio de fase um, que teve início em março.
“São notícias muito positivas no geral”, comentou Benjamin
Neuman, professor da Universidade do Texas à agência France-Presse de notícias
(AFP). O especialista também ressaltou que a resposta imunológicas permaneceu
“razoavelmente forte” nos idosos, o que, avalia, é outra notícia bastante
animadora revelada pelo estudo.
Tomado de correio brasiliense
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