Especialista defende a implementação de taxa proporcional no
DF para quem gasta mais o recurso
José Antônio usou os cortes de água para conscientizar a
família: incentivo à economia(foto: Barbara Cabral/Esp. CB/D.A Press)
Entre 2001 e 2002, o Brasil viveu a “crise do apagão”,
causada por uma combinação de fatores, como falta de chuva e de investimentos
na produção de energia elétrica. O resultado foi a impossibilidade de produzir
e atender a demanda de eletricidade, obrigando o governo a implementar uma
política de racionamento. Em oito meses, o consumo caiu, mas, quando o fantasma
do apagão começou a sumir da memória dos brasileiros, os gastos voltaram a
subir. Atualmente, na crise da água no Distrito Federal, esse é um dos receios
levantados por especialistas: que o brasiliense não tenha aprendido com o
problema.
Para o governador Rodrigo Rollemberg, todos criaram uma
consciência, o que vai garantir “o uso sustentável da água para essa e futuras
gerações”. Desde 2014, o consumo nas residências do DF registra queda, mesmo na
contramão ao crescimento da população. Há quatro anos, o uso era de 12,4 metros
cúbicos por residência. No ano seguinte, caiu para 11,6m³ e, depois, para
11,5m³. Após o racionamento, apresentou a maior redução: 10,4m³.
Para a cuidadora de crianças Cláudia Valentim, 45 anos, o
corte semanal representou uma descoberta. “Aprendi a reaproveitar a água e usar
só o necessário. Vou continuar economizando daqui para a frente. Não custa
nada. Caso um novo racionamento ocorra, estou preparada”, disse a moradora da
Candangolândia. Na casa do desempregado José Antônio da Silva, 65, o corte de
água também serviu como conscientização. “Incentivei os meus quatro netos e o
meu filho a economizar, e eles fizeram isso não apenas com a água. Deixaram de
desperdiçar com energia elétrica”, explicou José Antônio,
também da
Candangolândia.
A data para o fim do racionamento — 15 de junho — foi
anunciada no momento em que o Descoberto apresenta o maior volume dos últimos
23 meses: 91,1%. O especialista em recursos hídricos da Universidade de
Brasília (UnB) Sérgio Koide explica que o cenário é propício para a suspensão
dos cortes. No entanto, ele ressalta que seria prudente esperar pelo menos mais
um mês para definir uma data. “Mesmo com chances pequenas de termos algum
problema, talvez outros quesitos devessem ser avaliados, como se o consumo da
cidade voltará a subir e os impactos do período da seca”, comentou.
Cláudia aproveitou para aprender sobre o reúso:
"Vou continuar economizando"(foto: Barbara Cabral/Esp. CB/D.A Press)
Debates
Uma das condicionantes era a conclusão do Sistema Produtor
de Água de Corumbá IV. Segundo Rollemberg, o status de conclusão das obras é de
70%, e a previsão continua dezembro deste ano. Nos quase dois anos de crise
hídrica, mais de 1,4 mil litros de água foram adicionados aos reservatórios do
DF, com a inauguração de duas obras. Além disso, a Caesb readequou e interligou
o sistema (confira Captações de água no DF) para não sobrecarregar a Barragem
do Descoberto e o reservatório de Santa Maria.
Para Sérgio Koide, um dos pontos que também precisam ser
trabalhados para impedir novos estresses hídricos é criar políticas de tarifa
para reduzir o consumo. “O ideal seria implementar uma taxa proporcional aos
custos da rede. Um local de grande consumo, como Park Way, Plano Piloto ou Lago
Sul, deveria ter o valor da água superior aos das demais cidades. Quem consome
muito deveria pagar mais caro. Essa variação de valor faria com que todos
realmente lutassem pela preservação”, avaliou. A sugestão de Koide é estudada pela
Adasa, que pretende realizar uma audiência pública ainda neste semestre para
debater a tarifa diferenciada por renda.
O especialista também alerta para o consumo agrícola. De
acordo com ele, em junho, a produção aumenta, assim como os gastos. “Agora, o
governo tem de zelar para que haja uma melhora contínua no sistema e garantir
que a oferta seja compatível com o crescimento da demanda, que é grande”,
aponta.
Produtores
Entre os produtores rurais, o fim das restrições também foi
comemorado. Se na área urbana o racionamento ocorria uma vez a cada seis dias,
no campo, permitia-se a captação apenas das 6h às 9h e em dias intercalados. O
resultado foi a retração na agricultura local de R$ 600 milhões no ano safra
2016/2017, de acordo com a Secretaria de Agricultura.
A presidente da Associação dos Produtores Agroecológicos do
Alto São Bartolomeu (Aprospera), Fátima Cabral, defende que o racionamento não
deveria ter atingido os pequenos produtores. “O governo poderia ter tido um
olhar diferenciado para os agricultores, principalmente aqueles que produzem de
forma atenta e com os devidos cuidados com a preservação dos recursos hídricos
e que trabalham em sistemas agroflorestal e agroecológico”, enfatizou.
foto: CB/D.A Press)
Consumo médio por habitante
147 litros por dia antes do racionamento
129 litros por dia atualmente
"Agora, o governo tem de zelar para que haja uma
melhora contínua no sistema e garantir que a oferta seja compatível com o
crescimento da demanda”
Sérgio Koide, especialista em recursos hídricos da UnB
Sérgio Koide, especialista em recursos hídricos da UnB
Povo fala
Como o (a) senhor (a) avalia o fim do racionamento?
José de Jesus,
José de Jesus,
75 anos, aposentado, morador do Guará
“É uma faca de dois gumes. Nos primeiros meses, o resultado
pode ser positivo. Mas será que os reservatórios vão manter o nível por muito
tempo? Nem sempre o que imaginamos se torna realidade. Espero que um novo
racionamento não aconteça. O jeito é continuarmos economizando. Temos de fazer
a nossa parte”
Josinaldo do Nascimento,
43, churrasqueiro, morador da Candangolândia
“Por mim, poderia continuar. Infelizmente, muitas pessoas
ainda não mudaram os hábitos. Quando o racionamento acabar, elas usarão a água
da maneira que bem entenderem. Nem todos economizarão. Com o racionamento, pelo
menos por um dia, não há um desperdício tão exagerado”
Jailto Alves,
60, aposentado, morador do Guará
“Por mim, o racionamento poderia continuar. Acredito que a
população precisa se conscientizar ainda mais sobre a importância de não
desperdiçar água. Isso tem de virar um hábito para cada cidadão. Espero que as
pessoas não exagerem daqui para a frente. Com os reservatórios bem abastecidos,
isso não significa que podemos usar a água
de qualquer jeito”
Iliane Fonseca,
Iliane Fonseca,
38, servidora pública, moradora do Sudoeste
“Não acho que era o momento de se tomar essa decisão.
Deveria ser feito um remanejamento do racionamento. Manter para as residências,
cortando o abastecimento a cada 10 ou 15 dias, e liberar a água apenas para os
comércios, onde a necessidade é maior. Além disso, tivemos um longo período de
chuvas. Será que vai acontecer o mesmo com a seca?”
Oswaldo Pereira,
89, músico, morador da Candangolândia
89, músico, morador da Candangolândia
“Fiquei satisfeito com a notícia. Ninguém esperava que
um racionamento acontecesse. Trouxe muitos transtornos. Precisei trocar o
sistema de encanamento da minha casa por causa da força da água e, por várias
vezes, tive de esperar quase dois dias para o abastecimento voltar ao normal.
Saber que eu não vou mais encarar esses problemas é um alívio”
Renata Sousa,
32, autônoma, moradora da Candangolândia
“É gratificante saber que o racionamento vai acabar. Ficar
dois dias sem água a cada semana é um sacrifício. De qualquer forma, esse
período serviu de lição. Reforçou a importância de reduzirmos o consumo e
preservarmos a água. Vou manter esse costume daqui para a frente”
Tomado de correio brasiliense
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