Insetos têm, em seus membros, diferentes nanoestruturas que matam micro-organismos que pousam sobre eles. Cientistas americanos buscam, entre esses mecanismos, os que têm maior efeito antibactericida. O objetivo é explorá-los em soluções médicas
PO Paloma
Oliveto
De painéis solares a turbinas eólicas, passando por fitas
adesivas e plásticos de uso hospitalar, são incontáveis os objetos e as
tecnologias inspirados na natureza. Agora, as asas da libélula e da cigarra,
insetos que repelem alguns micro-organismos, poderão influenciar o
desenvolvimento de nanomateriais capazes de destruir bactérias, mesmo as
super-resistentes, segundo um estudo de revisão publicado na revista Nature
Reviews Microbiology.
As asas das cigarras e das libélulas são cobertas por
inúmeros nanopilares. As bactérias que pousam nessas nanoestruturas são
puxadas, esticadas ou cortadas, um processo que rompe a membrana celular e, por
fim, mata os micro-organismos. Os minúsculos capilares na superfície dos
insetos já foram reproduzidos por cientistas, com o objetivo de imitar o efeito
bactericida. O estudo de revisão, pela primeira vez, categoriza as diferentes
maneiras como essas estruturas fornecem as forças mecânicas necessárias para
romper a camada de proteção celular do patógeno e, assim, eliminá-lo.
“Nossas nanoestruturas biomiméticas sintéticas variam
substancialmente em seu desempenho antibacteriano e nem sempre está claro o
porquê”, afirma a principal autora do artigo, Elena Ivanova, pesquisadora da
universidade australiana RMIT, o antigo Instituto Real de Tecnologia de
Melbourne. De acordo com ela, catalogar as maneiras diversas pelas quais
libélulas e cigarras conseguem destruir a membrana celular das bactérias poderá
ajudar no desenvolvimento de materiais de uso hospitalar, um ambiente permanentemente
ameaçado pelas superbactérias resistentes aos antibióticos. Por ano, a
Organização Mundial da Saúde (OMS) calcula que ocorrem 700 mil óbitos devido a
esse problema.
Ivanova explica que, assim como a equipe da RMIT, cientistas
de várias instituições estão em busca de respostas que possam levar à obtenção
desse material, como as dimensões ideais do nanopadrão para que seja o mais
letal possível. “Mesmo olhando para as libélulas, por exemplo, vemos que
espécies diferentes têm asas que são mais eficientes para matar algumas
bactérias do que outras”, afirma. “Quando examinamos as asas em nanoescala,
vemos diferenças na densidade, na altura e no diâmetro dos nanopilares que
cobrem as superfícies dessas asas. Então, sabemos que a chave está em obter as
nanoestruturas corretas.”
De acordo com a pesquisadora, se for possível entender
exatamente como os nanopadrões inspirados em insetos matam as bactérias, a
engenharia dessas formas ficará mais precisa e eficaz contra as infecções.
“Nosso objetivo final é desenvolver superfícies antibacterianas escaláveis e de
baixo custo para uso em implantes e em hospitais e fornecer novas armas
poderosas na luta contra superbactérias letais.”
Material experimental
Embora reconheça que a produção de superfícies
nanoestruturadas em grandes volumes com boa relação custo-benefício ainda seja
um desafio, Ivanova afirma que avanços recentes nas tecnologias de
nanofabricação mostraram-se promissores para a abertura de uma nova era da
nanotecnologia antimicrobiana biomédica. Em maio, por exemplo, cientistas
publicaram na revista da Associação Norte-Americana de Química um artigo no
qual descrevem um material experimental que repele vírus e bactérias.
No estudo, um dos catalogados por Elena Ivanova, pesquisadores da Faculdade de
Tecnologia de Queensland, na Austrália, replicaram o efeito antimicrobiano das
libélulas e cigarras ao reproduzir os nanopadrões da superfície das asas desses
insetos. A equipe, liderada por Prasad Yarlagadda, pretendia inativar, além de
bactérias, vírus.
Os cientistas fizeram experiências com discos de alumínio
6063, que são usados em batentes de portas, painéis de janelas e equipamentos
hospitalares e médicos. O condicionamento ácido dos discos com hidróxido de
sódio por até três horas mudou a superfície inicialmente lisa e hidrofóbica,
transformando-a em ondulada e hidrofílica, com nanopadrões semelhantes aos das
asas dos insetos. Bactérias ou vírus foram, então, aplicados aos discos.
A maioria das bactérias Pseudomonas aeruginosa e
Staphylococcus aureus foi inativada após três horas na superfície. Já os vírus
respiratórios morreram em duas horas. “Ambos resultados foram melhores do que o
verificado em superfícies de plástico ou alumínio liso. Os discos mantiveram
sua eficácia mesmo após os testes projetados para simular o desgaste que sofrem
no cotidiano hospitalar”, diz Yarlagadda.
Os pesquisadores observam que esse é o primeiro trabalho a mostrar propriedades
antibacterianas e antivirais combinadas em uma superfície durável e
nanoestruturada. De acordo com Yarlagadda, que, agora, estuda as superfícies
nanotexturizadas para combater o Sars-CoV-2, a estratégia poderia ser estendida
além do uso hospital, em outros locais com grande circulação de pessoas.
TOMADO DE CORREIO BRASILIENSE
No hay comentarios:
Publicar un comentario