Caça a aves afeta espécies que evitariam
colapso da Mata Atlântica
- Flores deixam de ser
polinizadas e floresta fica com potencial menor de germinação, de acordo
com estudo publicado na ‘Science’
Tucano-de-bico-preto.
Grande dispersor de sementes, ele já está extinto em fragmentos de Mata
AtlânticaDivulgação/Lindolfo Souto
RIO- A caça
a aves como tucanos e arapongas acelera a perda de diversidade da Mata
Atlântica. As flores deixam de ser polinizadas e as sementes, além de dispersas
em uma área mais restrita, tornam-se cada vez menores, e com menor potencial de
germinação. O diagnóstico, publicado hoje na revista “Science”, é de um grupo
de cientistas da Unesp (Universidade Estadual Paulista), USP (Universidade de
São Paulo) e UFG (Universidade Federal de Goiás), com a colaboração de
institutos de pesquisa da Espanha e do México.
O estudo
foi realizado em 22 áreas de Mata Atlântica entre o Sul da Bahia e Foz do
Iguaçu, no Paraná. Das áreas remanescentes do bioma em todo o país, 80% estão
em pequenos fragmentos, como os analisados.
Ainda no
século XIX, a floresta tropical foi afetada pela extração de madeira e, também,
por culturas de café e cana-de-açúcar. Grandes animais que se alimentam de
frutos, como antas, macacos e tucanos, não sobreviveram. Regiões tomadas por
palmeiras não regeneraram a vegetação original.
No mesmo
período, houve uma mudança evolutiva acentuada nas características das plantas,
notadamente a diminuição de suas sementes — um sério revés para a possibilidade
de revitalização do bioma.
Os
pesquisadores compararam a população de palmeiras das áreas estudadas. Cerca de
nove mil sementes foram coletadas para análise em laboratório. Marcadores
genéticos de DNA estimaram o tempo de isolamento das plantas — já que a área ao
redor delas foi desflorestada. Câmeras automáticas foram usadas para fazer
censo de animais que se nutriam de plantas. Também foram consideradas a
influência do clima (como a intensidade do regime de chuvas) e a fertilidade do
solo em cada região descrita.
— Por esta
análise multidisciplinar, descobrimos que a redução das sementes está
relacionada à caça. A perseguição a espécies que se alimentam de sementes é
muito mais importante do que a demografia — explica Mauro Galetti, líder do
grupo de estudo e professor do Departamento de Ecologia da Unesp. — A perda de
habitats está provocando mudanças na interação das espécies no ecossistema.
Os tucanos
mereceram atenção especial, por serem uma das poucas espécies que se nutrem de
grandes sementes. Pequenas regiões florestais não têm uma quantidade suficiente
de sementes para nutrir estas aves. Na falta deles, as sementes das palmeiras
caem sob a planta e não germinam, por não haver quem retire sua polpa. O ataque
de fungos, patógenos e roedores acabam de vez com a possibilidade de
regeneração da flora.
— Fizemos
uma análise genética e concluímos que, se fossem mortas todas as aves que se
alimentam de frutas de uma região, as sementes de palmeiras de lá perderiam
tamanho entre 50 e 75 anos — alerta Galetti. — É uma interferência muito rápida
promovida pelo homem no processo evolutivo da natureza. Algumas espécies,
inclusive, já estão extintas localmente. No estado de São Paulo, não
encontramos mais determinados tipos de tucanos.
Os mesmos
marcadores genéticos confirmaram que as sementes começaram a perder tamanho há
cerca de 200 anos — o período em que a colonização da Mata Atlântica tornou-se
mais intensa.
Entre as
poucas aves adaptadas a regiões altamente degradadas estão os sabiás, que comem
sementes pequenas, de até 12 milímetros.
Homem
acelera extinção
As mudanças
climáticas devem contribuir para a degeneração dos ecossistemas sobreviventes.
Segundo prognósticos, as regiões da Mata Atlântica podem sofrer, nas próximas
décadas, longos períodos de estiagem. As sementes, já pequenas, ficarão
ressecadas, o que reduzirá seu potencial de germinação.
A seleção
natural é normalmente associada a lentas mudanças evolutivas. Biólogos
acreditam que a extinção de uma espécie pode demorar até 1 milhão de anos. Mas
a ciência já sabe que outras passariam por este processo mais lentamente, como
bactérias e mosquitos.
O estudo de
Galetti confirma como a interferência humana pode ser uma pá de cal na
sobrevivência de diversos seres vivos. O homem poderia acelerar a extinção de
outras espécies em até 100 vezes.
— Já
sabemos que ocorre um rápido processo evolutivo em alguns organismos. Mas, até
agora, poucos trabalhos apontam evidências de que mudanças deste gênero, e com
esta velocidade, podem acontecer em populações naturais — ressalta o
pesquisador. — Há um grande risco de desaparecimento de árvores tropicais, já
que elas dependem dos animais para dispersar suas sementes.
Para o
pesquisador, seu estudo não reflete uma situação isolada. O mesmo fenômeno
poderá ser registrado na Amazônia.
— Este é um
bioma que, aos poucos, passa pela mesma degeneração da Mata Atlântica —
lamenta. — O desmatamento foi muito intensificado nos últimos 50 anos. Pode,
portanto, motivar uma mudança evolutiva em algumas espécies. É fundamental não
interferir na relação entre as plantas e os grandes vertebrados, que se alimentam
de seus frutos e dispersam as sementes. Sem essa regeneração natural da
floresta, o ecossistema enfrentará um colapso.
VER MAS EN http://oglobo.globo.com/ciencia/caca-aves-afeta-especies-que-evitariam-colapso-da-mata-atlantica-8549923#ixzz2UyZhtFz1
TOMADO DE O GLOBO DE BR
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