Gelo no
Ártico pode diminuir 94% e o nível do mar subiria 82 cm até 2100
Relatório
do Painel da ONU reúne previsões do aquecimento global até o fim do século,
apontando aumento de temperatura de até 4,8 graus
Cláudio
Motta
Fábrica na
China lança poluentes na atmosfera contribuindo para o aquecimento
globalScience Photo Library
RIO - A
previsão do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU (IPCC) é
que o aquecimento global até o final do século 21 seja “provavelmente superior”
a 2 graus (com pelo menos 66% de chances disto acontecer), superando o limite
considerado seguro pelos especialistas. Até 2100, o nível do mar deve aumentar
perigosamente de 45 a 82 centímetros, considerando o pior cenário (ou de 26 a
55 centímetros, no melhor), e o gelo do Ártico pode diminuir até 94% durante o
verão local.
Além disso,
o relatório do IPCC -- publicado na manhã desta sexta-feira em Estocolmo, na
Suécia, com as bases científicas mais atualizadas sobre as mudanças climáticas
-- considera que há mais de 95% de certeza para afirmar que o homem causou mais
da metade da elevação média da temperatura entre 1951 e 2010. Neste período, o
nível dos oceanos aumentou 19 centímetros.
O
documento, com o trabalho de 259 cientistas e representantes dos governos de
195 países, inclusive o Brasil, ressalta que parte das emissões de CO2
provocadas pelo homem continuará a ser absorvida pelos oceanos. Por isso, é
praticamente certo (99% de probabilidade) que a acidificação dos mares vai
aumentar, afetando profundamente a vida marinha.
— A mudança
de temperatura da superfície do planeta deve exceder 1,5 grau, e,
provavelmente, será superior a 2 graus — disse o copresidente do trabalho
Thomas Stocker. — É muito provável que as ondas de calor ocorram com mais
frequência e durem mais tempo. Com o aquecimento da Terra, esperamos ver
regiões atualmente úmidas recebendo mais chuvas, e as áridas, menos, apesar de
haver exceções.
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Os
especialistas fizeram quatro projeções considerando situações diferentes de
emissões de gases-estufa. Em todas, há aumento de temperatura. As mais brandas
ficam entre 0,3 ºC e 1,7 ºC. Nestes casos, seria necessário diminuir muito as
emissões. Já no cenário mais pessimista, o aquecimento ficaria entre 2,6 ºC e
4,8 ºC.
- Na minha
opinião, o relatório é muito bom, repleto de informações e todas muito bem
fundamentadas – comentou a especialista brasileira Suzana Kahn, que faz parte
do grupo de pesquisadores do IPCC em Estocolmo. - No fundo, o grande ganho é a
comprovação do que tem sido dito há mais tempo, com muito mais informação sobre
o papel dos oceanos, das nuvens e aerossóis. Isto é muito importante para o
mundo científico, pois aponta para áreas que precisam ser mais investigadas.
Suzana
conta que a dificuldade de fazer projeções e análises para o Hemisfério Sul
causou muita polêmica. O grande problema é a falta de dados:
- Acho que
isto foi interessante para comprovar que estávamos certos ao criar o Painel
Brasileiro de Mudança Climática para suprir esta lacuna.
De acordo
com Carlos Rittl, Coordenador do Programa de Mudanças Climáticas e Energias do
WWF-Brasil, o relatório do IPCC deixa uma mensagem clara: o aquecimento global
é incontestável. E é preciso começar agora contra os piores efeitos.
- O
relatório do IPCC reafirma algumas certezas e vai além. Aponta a perda de massa
de gelo, o aumento do nível dos oceanos, o incremento de chuvas onde já se
chove muito, além da diminuição da umidade nas regiões mais áridas. No Brasil,
o semiárido pode se tornar mais árido. Por outro lado, o Sul e Sudeste podem
ter mais chuvas do que hoje - enumerou Rittl. - É importante ressaltar que o
relatório fala de médias. Ou seja, em algumas regiões do país pode haver
aumento de seis graus, com picos de mais de oito graus. A gente não está
preparado para isso. E nossas emissões nos colocam numa trajetória de altíssimo
risco, mais próxima dos piores cenários.
Para Rittl,
a ciência está dando uma mensagem clara: é preciso diminuir as emissões. Isso
significa levar os temas relacionados às mudanças climáticas para as decisões
políticas:
- Hoje o
aquecimento global ainda é um tema marginal. Os investimentos em
infraestrutura, energia, o plano Safra, todos os grandes investimentos da
escala de trilhões de reais não têm praticamente nenhuma vinculação com a
lógica de baixo carbono. Estamos sendo pouco responsáveis.
Combustíveis
fósseis
Já o
Greenpeace critica os investimentos do Brasil em combustíveis fósseis, que
emitem gases-estufa:
- Diante
desse cenário, vemos um descompasso entre o que o Brasil precisa fazer para
reduzir suas emissões e o que, de fato, está fazendo. Apesar de todas as
evidências, insiste em investir altos recursos na exploração de combustíveis
fósseis - reclamou Sérgio Leitão, diretor de políticas públicas do Greenpeace
Brasil. - O Brasil terá o primeiro leilão para o pré-sal em menos de um mês,
evidenciando sua escolha por uma atividade arriscada, insegura e suja, que pode
colocar o país entre os maiores emissores do mundo.
Deixar de
queimar combustível é um enorme desafio, explica o professor do Departamento de
Engenharia Mecânica da PUC-Rio Luis Fernando Figueira da Silva. Citando números
da Agência Internacional de Energia, ele diz que 85% da energia no planeta vêm
de processos de combustão, gerando CO2.
- Quando a
gente queima uma coisa, tiramos a energia do combustível de uma maneira fácil.
Sabemos fazer isso há milênios. Este é um impasse de civilização - ponderou
Silva. - Temos que aproveitar as fontes solar e eólica, sem dúvida, mas não
podemos prescindir da combustão, sem a qual não dá para transformar metal ou
fazer vidro, por exemplo. A primeira coisa é apostar em eficiência. Diminuir o
consumo de combustível e das emissões. Um ganho de 28% de eficiência na
indústria brasileira representaria uma economia de 13 Itaipus de energia.
Diplomacia
e ciência
John Kerry,
secretário de Estado dos EUA, ressalta que o relatório do IPCC não deve ser
esquecido num armário, nem interpretado como uma peça política feita por
políticos: “é ciência”, resume. De acordo com ele, os Estados Unidos estão
"profundamente comprometidos em combater as mudanças climáticas",
reduzindo emissões de gases-estufa e investindo em formas eficientes de
energia.
Este é mais
um chamado de atenção: aqueles que negam a ciência ou procuram desculpas para
evitar a ação estão brincando com fogo – afirmou Kerry. - O resumo do relatório
do IPCC é este: a mudança climática é real, está acontecendo agora, os seres
humanos são a causa dessa transformação, e somente a ação dos seres humanos
pode salvar o mundo de seus piores impactos.
Lançado a
cada seis anos, os relatórios do IPCC estão sob críticas de especialistas. O
processo de análise dos documentos por representantes do governo acaba chegando
a uma situação intermediária entre diplomacia e ciência, explica Emilio La
Rovere, pesquisador da Coppe/UFRJ.
— O
resultado é um meio termo entre diplomacia e ciência — afirmou Rovere.
Um dos
pontos mais polêmicos são os chamados hiatos, períodos de cerca de 15 anos em
que a temperatura média do planeta não aumenta. Por exemplo, a Agência Estatal
de Meteorologia da Espanha anunciou, nesta semana, que o último trimestre na
Península Ibérica foi o menos quente desde 2008. Entretanto, o relatório de
2007 do IPCC não citou estas pausas do aquecimento, dando argumento aos
céticos.
Limite do
aquecimento global
As
informações do IPCC são importantes para a criação de estratégias de combate às
mudanças climáticas. Na Convenção do Clima da Dinamarca (COP-15, realizada em
2009), foi criada a meta de limitar o aquecimento global em 2 graus. Para isso
acontecer em 2050, explica Emilio La Rovere, da Coppe/UFRJ, seria necessário
cortar 80% das emissões em comparação com 1990:
— Os
modelos matemáticos simulando evolução demográfica, economia mundial, demanda e
oferta de energia mostram que fica realmente quase impossível atingir este
objetivo.
Este é o
Quinto Relatório do IPCC, que será lançado em quatro partes, entre setembro de
2013 e novembro de 2014. Nesta sexta-feira, foi publicado o documento do Grupo
de Trabalho I (sobre os aspectos científicos das mudanças climáticas). Entre os
dias 25 e 29 de março de 2014, será a vez do Grupo de Trabalho II (analisando
os impactos, a adaptação e a vulnerabilidade), que se reunirá em Yokohama, no
Japão. O Grupo de Trabalho III (especializado na mitigação dos impactos das mudanças
climáticas) está previsto para os dias 7 e 11 de abril em Berlim, na Alemanha.
Por fim, será criado um relatório síntese, cujos trabalhos ocorrerão entre os
dias 27 e 31 de outubro, em Copenhague, na Dinamarca.
Tomado de o globo de
brasil
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