Extinção teria sido provocada pela atividade silenciosa de vulcões que,
depois do impacto de um meteoro, começaram a produzir gases modificadores da
atmosfera
PO Paloma Oliveto
Esqueleto de um tiranossauro: os animais gigantes viveram durante 160
milhões de anos e desapareceram da Terra há cerca de 66 milhões: extinção
intriga leigos e cientistas até hoje (foto: AFP)
Esqueleto de um tiranossauro: os animais gigantes viveram durante 160
milhões de anos e desapareceram da Terra há cerca de 66 milhões: extinção
intriga leigos e cientistas até hoje
(foto: AFP)
Eles dominaram a Terra por mais de 160 milhões de anos, até serem
varridos do planeta há cerca de 66 milhões de anos. Até hoje despertando
fascínio e curiosidade, os dinossauros protagonizam um debate ainda não
resolvido: o que, afinal, causou a extinção de um grupo composto por milhares
de espécies e que ocupou o globo por tanto tempo. Em um estudo publicado na
revista Science, pesquisadores sustentam que o evento foi resultado de uma
conjunção de fatores: a queda de um meteoro no Mar do Caribe e a atividade das
chamadas Armadilhas Deccan, um depósito de vulcões a meio mundo dali, onde hoje
é a Índia.
Contudo, ao contrário do que já se sugeriu, o trabalho da Universidade
de Bekerley, na Califórnia, sugere que não foram as fortes erupções de lava que
mataram a megafauna pré-histórica. A atividade dos vulcões, um resultado de
superterremotos deflagrados pelo impacto do meteoro, de fato levou à maior
destruição em massa de que se tem notícia, destacam os pesquisadores, mas não
da forma que se imagina. O sistema de datação utilizado pelos cientistas
indicou que, no ápice desse fenômeno, a extinção já havia ocorrido.
Diferentemente, eles sustentam que o fim da era dos dinossauros está atrelado
às mudanças climáticas causadas pela emissão de gases produzidos no magma
subterrâneo, o que independe da ejeção de lava.
As teorias do impacto e da atividade vulcânica onde hoje é a Índia vêm
sendo propostas há tempos. Mas, segundo os pesquisadores que publicaram na
Science, sem o nível de precisão que técnicas modernas de datação agora
permitiram fazer. “Mais que lançar luz sobre o passado, o estudo nos informa
como são as respostas da biosfera a mudanças ambientais dramáticas e pode
ajudar a validar as hipóteses sobre as prováveis consequências das mudanças
antropogênicas que vivenciamos hoje”, observa Seth Burgess, pesquisador do US Geological
Survey, que não participou do trabalho.
As teorias do impacto de um asteroide ou cometa e do vulcanismo
surgiram nas décadas de 1980 e 1990, com as descobertas, respectivamente, de
níveis elevados de irídio nas camadas de transição entre os períodos Cretáceo e
Paleogeno, indicando a ejeção e o choque de minerais, e de uma cratera de
impacto na península de Yacután, no México. “Apesar dessas evidências, a
hipótese foi alvo de algum ceticismo porque muitos eventos de extinção,
incluindo o da transição Cretáceo/Paleogeno, coincidem com a erupção de volumes
enormes de rocha vulcânica na crosta terrestre”, continua Burgess.
No estudo da Universidade de Bekerley, os cientistas apresentam uma
cronologia dos eventos que coincide com a megaextinção do fim do período
Cretáceo, o chamado limite K-Pg. A sequência de vulcanismos de um milhão de
anos cuspiu lava por distâncias de pelo menos 500km pelo continente indiano,
criando os chamados basaltos de inundação das Armadilhas Deccan que, em alguns
lugares, têm quase 2km de espessura. “Eu diria, com grande confiança, que as
erupções ocorreram entre 50 mil anos e 30 mil anos depois do impacto, o que
significa que os eventos estavam sincronizados dentro de uma margem de erro”,
diz Paul Renne, professor na Universidade de Berkeley e autor sênior do estudo.
“Essa é uma validação importante da hipótese de que o impacto de um asteroide
ou de um cometa foi seguido por violentas erupções.”
Vulcões Deccan Traps, na Índia: sistema ajudou a destruir a fauna do
período Cetáceo, incluindo os dinossauros(foto: Mark Richards/UC
Berkeley/Divulgação)
Vulcões Deccan Traps, na Índia: sistema ajudou a destruir a fauna do
período Cetáceo, incluindo os dinossauros
(foto: Mark
Richards/UC Berkeley/Divulgação)
As novas datações também confirmam estimativas anteriores de que os
fluxos de lava continuaram por cerca de 1 milhão de anos, mas trazem uma
surpresa: três quartos da lava irromperam após o impacto. Estudos anteriores
sugeriram que cerca de 80% do material eclodiu antes do choque. Se esse segundo
cenário fosse verdadeiro, os gases emitidos durante as erupções poderiam ter
sido a causa do aquecimento global nos últimos 400 mil anos do Cretáceo, quando
as temperaturas aumentaram em média 8ºC.
Durante esse período de aquecimento, as espécies teriam evoluído de
acordo com as novas condições de calor, apenas para serem pegas de surpresa
pelo resfriamento global causados pelo impacto ou pelo vulcanismo. Erupções
vulcânicas produzem muitos gases, como dióxido de carbono e metano, conhecidos
por aquecer o planeta. Contudo, outras substâncias, como aerossóis sulfúricos,
provocam o efeito contrário. O impacto do asteroide pode ter enviado grandes
quantidades de poeira para a atmosfera, bloqueando a luz solar e esfriando o
globo.
“O frio teria sido um choque do qual a maioria das criaturas nunca
teria se recuperado, desaparecendo inteiramente do registro fóssil:
literalmente, uma extinção em massa”, diz a primeira autora do estudo, Courtney
Sprain, pesquisadora de pós-doutorado da Universidade de Liverpool. “Mas se a
maioria das lavas das Armadilhas Deccan surgiram após o impacto, esse cenário
precisa ser repensado. Isso muda nossa perspectiva sobre o papel delas na
extinção do K-Pg. Ou as erupções em Deccan não desempenharam um papel — o que
achamos improvável — ou muitos gases que modificam o clima irromperam durante o
período de menor volume das erupções”, diz.
hipótese de que gases vulcânicos
que alteram o clima vazam das câmaras de magma subterrâneas com frequência, e
não apenas durante as erupções, é apoiada por evidências de vulcões atuais,
como os do Etna, na Itália, e de Popocatepetl no México, disseram os
pesquisadores. O magma fervente abaixo da superfície é conhecido por transmitir
gases para a atmosfera, mesmo sem a ocorrência de erupções. “Estamos sugerindo
que é muito provável que muitos dos gases originados dos sistemas de magma
precedam as erupções; eles não estão necessariamente correlacionados com as
erupções”, diz Sprain. No caso da extinção do K-Pg, os primeiros sinais de
mudanças climáticas significativas ocorreram antes do pico do vulcanismo.
“Mais que lançar luz sobre o
passado, o estudo nos informa como são as respostas da biosfera a mudanças
ambientais dramáticas e pode ajudar a validar as hipóteses sobre as prováveis
consequências das mudanças antropogênicas que vivenciamos hoje”
Seth Burgess, pesquisador do US Geological
Survey
alavra de especialista
Saber crucial
“A extinção em massa do Cretáceo
é um dos eventos mais conhecidos da história da Terra. Ela provoca a imaginação
do público como nenhum outro, em parte porque envolveu o fim de uma megafauna
particularmente fascinante, os dinossauros, e em parte porque força a
humanidade a pensar sobre a própria mortalidade. Nós estamos enfrentando agora
o que vem sendo chamado de ‘sexta extinção em massa’, o que tem sido causado
por nossas ações. Entender eventos de extinção do passado — suas causas e uma
eventual recuperação do clima e da vida — é crucial, portanto, quando tentamos
pensar sobre os muitos resultados possíveis da nossa atual trajetória em
direção a mudanças climáticas desastrosas, à destruição do ecossistema e à
possível extinção em massa.” Paul Renne,
professor na Universidade de Berkeley TOMADO DE CORREIO BRAZILIENSE
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