Pesquisa constata que a concentração de partículas de
polietileno e náilon, entre outros materiais tóxicos, nas camadas de gelo do
Oceano Ártico é maior do que se imaginava. Cientistas ainda não sabem quais os
riscos acarretados ao ecossistema marinho e à saúde humana
Vista aérea do Ártico: na origem da poluição, está a
quantidade de lixo despejado no Oceano Pacífico, segundo as conclusões do
estudo(foto: Rüdiger Stein/Alfred-Wegener-Institut)
Vista aérea do Ártico: na origem da poluição, está a
quantidade de lixo despejado no Oceano Pacífico, segundo as conclusões do
estudo
(foto: Rüdiger Stein/Alfred-Wegener-Institut)
A olho nu, o fenômeno é imperceptível. Por isso, só agora se
tem a dimensão do problema. Depois de investigar amostras das cinco regiões do
Oceano Ártico, especialistas do Instituto Alfred Wegener e do Centro Helmohlz
para Pesquisa Polar e Marinha, na Alemanha, descobriram que as águas
aparentemente límpidas que circundam o continente gelado estão repletas de
lixo. A cada litro, há 12 mil partículas microplásticas, uma quantidade muito
superior ao que se imaginava. A razão de só agora os cientistas terem a
dimensão real da poluição marinha está no tamanho desses resíduos, quase todos
microscópicos.
Além de mensurar a sujeira no mar, os pesquisadores
conseguiram identificar a possível origem da poluição. Trata-se de uma cadeia
poluente: de acordo com os cientistas, que publicaram os resultados na revista
Nature Communications, muitas dessas partículas são provenientes de uma
“massiva” quantidade de lixo despejado no Oceano Pacífico que, por sua vez,
apresenta grande percentual de tinta e náilon, provavelmente originárias da
atividade pesqueira e das embarcações do Oceano Ártico. O que não deixa dúvida
para as equipes é que, por trás de tanta sujeira, estão as mãos humanas.
Em 50 anos, áreas de oceanos sem oxigênio quadruplicaram,
revela estudo
“Durante nosso trabalho, percebemos que mais da metade das
partículas microplásticas contidas no gelo tinha menos de 1/20 de milímetro de
largura, o que significa que podem ser facilmente ingeridas por
micro-organismos árticos, como ciliados e copépodes (importante família de
crustáceos)”, diz a bióloga e primeira autora do estudo, Ilka Peeken. A
observação é muito problemática, assinala. “Ninguém pode dizer com certeza o
quão perigosas essas pequenas partículas plásticas são para a vida marinha e
também para os seres humanos.” Os pesquisadores do Instituto Alfred Wegener
coletaram amostras ao longo de três expedições a bordo do quebrador de gelo
Polastern na primavera de 2014 e no verão de 2015. Eles coletaram o material de
cinco regiões.
O termo microplástico refere-se a partículas plásticas, fibras,
granulados de madeira e outros fragmentos com comprimento, diâmetro ou largura
variando de poucos micrômetros (um micrômetro corresponde a um milionésimo de
milímetro) a cinco milímetros. Uma quantidade considerável de microplásticos é
lançada diretamente no oceano pela deterioração gradativa de pedaços grandes de
plástico. Mas também podem ser criados na terra; por exemplo, no processo de
abrasão dos pneus do carro, quando inicialmente se suspendem no ar e, então,
são projetados ao mar pelo vento.
Para determinar a quantidade exata da distribuição de
microplásticos no Oceano Ártico, os pesquisadores do instituto foram os
primeiros a analisar o núcleo das camadas de gelo usando um equipamento que
bombardeia o material com luz infravermelha e usa um método matemático para
analisar a radiação que elas refletem de volta, técnica chamada Espectrometria
de Infravermelho com Transformada de Fourier (FTIR). Dependendo da composição,
as partículas revelam diferentes comprimentos de ondas, permitindo a identificação
de cada substância pelas pegadas ópticas.
“Com essa abordagem, também descobrimos partículas plásticas
que tinham apenas 11 micrômetros. Isso é quase um sexto do diâmetro de um fio
de cabelo humano, e também explica o motivo de termos encontrado concentrações
de cerca de 12 mil partículas por litro de mar, o que é duas ou três vezes mais
do que constatamos em mensurações prévias”, diz Gunnar Gerdts, em cujo
laboratório os cálculos foram feitos. Surpreendentemente, os pesquisadores
descobriram que 67% das partículas detectadas no gelo pertenciam à menor
categoria da escala, a de “50 micrômetros para baixo”.
A densidade e a composição das partículas variaram
significativamente dependendo da amostra. Ao mesmo tempo, os cientistas
determinaram que elas não se distribuíam uniformemente pelo núcleo do gelo.
“Nós rastreamos a jornada dos blocos gelados que examinamos e podemos dizer com
segurança que tanto a região em que o gelo marinho é inicialmente formado
quanto a massa de água na qual o material flutua pelo Ártico têm uma enorme
influência”, diz Peeken.
Embalagens
A equipe também descobriu que as banquisas levadas pelas
massas de água do Pacífico na Bacia Canadense contêm concentrações
particularmente altas de polietileno. Esse material é usado em praticamente
toda embalagem do mundo. “De acordo com isso, acreditamos que esses fragmentos
representam restos do assim chamado Bloco de Lixo do Grande Pacífico, e
empurrado pelo Estreito de Bering e para o Oceano Ártico pelo influxo do
Pacífico”, escreveram os cientistas.
Em contraste, eles encontraram partículas predominantemente
de tinta de navio e lixo de náilon de redes de pesca no gelo próximo à Sibéria.
“Isso sugere que tanto a expansão da navegação quanto da pesca no Ártico estão
deixando sua marca. Essas altas concentrações de microplásticos no mar gelado
podem não ser atribuídas apenas às fontes de fora do Oceano Ártico. Em vez
disso, apontam para uma poluição local”, atesta Ilka Peeken.
A pesquisadora conta que foram identificados 17 tipos
diferentes de plástico no mar de gelo, incluindo material de embalagem, mas
também poliéster e acetato de celulose — esse último, usado na manufatura de
filtro de cigarro. Juntas, essas substâncias e o polietileno, a tinta e o náilon
contam por metade de todas as partículas de microplástico detectadas. Segundo
Peeken, “o mar gelado liga todo esse lixo plástico por dois a 11 anos no
máximo, tempo necessário para a banquisa dos mares marginais da Sibéria ou do
ártico norte-americano alcançarem o Estreito de Fram, onde derretem”. Ao mesmo
tempo, isso significa que o mar gelado transporta grandes quantidades de lixo
para as águas da Groenlândia.
Os cientistas afirmam que não podem dizer ainda se as
partículas continuam no Ártico ou se são transportadas para o sul. De fato,
parece que o lixo plástico começa a afundar para águas profundas relativamente
rápido. “Partículas microplásticas que flutuam livremente, geralmente, são
colonizadas por bactérias e algas, o que as fazem mais e mais pesadas. Às
vezes, elas se agregam às algas, fazendo com que desçam para o fundo do mar
muito mais rapidamente”, explica a bióloga Melanie Bergmann, coautora do
trabalho. Tomadode corereio brazilianse
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