Conta de luz pode
subir 18,7% em 2015 - Impacto virá do socorro ao setor e de uso de térmicas.
Relatório prevê reservatórios a 15% em novembro DANIELLE NOGUEIRA, HENRIQUE
GOMES BATISTA E LINO RODRIGUES
Usina de Marimbondo, na fronteira de Minas Gerais: bancos
avaliam que socorro a distribuidoras é ‘excelente negócio’ Michel
Filho/14-3-2014
RIO e SÃO PAULO - Depois que o governo aprovou um reajuste
de até 29% nas tarifas este ano, a conta de luz dos consumidores deve ficar
ainda mais salgada em 2015. Segundo cálculos da consultoria Safira Energia, o
aumento médio será de 18,7% no próximo ano. Boa parte desse reajuste é
resultado do socorro ao setor elétrico, que já soma R$ 24,2 bilhões este ano.
E, mesmo assim, alguns especialistas avaliam que o montante não será suficiente
para sanar os problemas por que passa o setor, com um cenário de chuvas
escassas e uso intenso de usinas térmicas, uma energia suja e cara. Ou seja, na
prática, o peso da conta para o consumidor pode se tornar ainda maior.
Dos R$ 24,2 bilhões de socorro, entram no cálculo da Safira
o aporte do Tesouro Nacional de R$ 9 bilhões previsto no Orçamento deste ano —
que será custeado via Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), com impacto de
4,6% na conta de luz este ano — e o empréstimo de R$ 11,2 bilhões ao setor via
Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE). Um novo aporte, de R$ 4
bilhões, anunciado em março deste ano, não foi considerado porque ainda não
está claro como será custeado.
Relatório vê
reservatório abaixo de 2001
A consultoria considerou em seus cálculos um percentual de
7,5% em média este ano de reajuste de tarifa das distribuidoras. Além disso, a
estimativa leva em conta o custo do despacho das térmicas este ano, que, por
decisão do governo, só afetará a conta de luz a partir de 2015.
O impacto da energia térmica é da ordem de R$ 9,6 bilhões,
mas o valor deve ser diluído entre 2015 e 2018. Da mesma forma, o ressarcimento
do empréstimo tomado via CCEE, de R$ 11,2 bilhões, só deve ocorrer entre 2015 e
2016.
De acordo com os cálculos da Safira, o reajuste de 18,7%
deve se repetir em 2016, caindo para 14,1% em 2017 e mais 14,1% em 2018.
— O problema do setor elétrico começou quando distribuidoras
de energia ficaram subcontratadas porque algumas geradoras, entre elas térmicas
do grupo Bertin, não conseguiram entregar a energia vendida nos leilões. As
distribuidoras, então, tiveram que comprar energia no mercado de curto prazo,
em que o preço estava muito elevado. A situação se agravou com o nível baixo
dos reservatórios — diz Fábio Luiz Cuberos, gerente de Regulação da Safira.
Na avaliação de Cuberos, o resultado do leilão de energia
marcado para a próxima quarta-feira será determinante para dimensionar se o
socorro dado ao setor até agora é suficiente. Segundo ele, as distribuidoras
precisam contratar 3.200 MW médios, mas acredita que esse volume não será
ofertado no leilão. A estimativa é que metade ou pouco mais da metade da
demanda seja preenchida.
Especialistas ouvidos pelo GLOBO avaliam que o polêmico
empréstimo de R$ 11,2 bilhões assumido pela CCEE é apenas um dos fatores de
preocupação no setor elétrico. Sem uma equação definitiva, temem que os
problemas sejam maiores e que, ainda no segundo semestre, o governo precise
fazer nova injeção de recursos nas empresas elétricas.
Um dos fatores que corroboram essa avaliação é um relatório
do Operador Nacional do Sistema (ONS) que mostra que os reservatórios do
Sudeste/Centro-Oeste podem chegar a 15,7% em novembro, início do período
chuvoso. O cálculo considera que entre maio e novembro o índice de chuvas seria
de 75% da média histórica para o período.
O patamar é inferior ao dos piores momentos de 2001, o ano
do racionamento, quando o patamar dos reservatórios na mesma região foi de 20%.
Atualmente, o patamar dos reservatórios está em 37,7%. Procurado oficialmente,
o ONS não quis se pronunciar sobre o assunto.
— Se não chover a partir de novembro, estamos lascados — disse
uma fonte familiarizada com o relatório.
Caso este prognóstico se confirme, será necessário usar mais
energia térmica. Além disso, a medida pode aumentar o temor de racionamento.
Para especialistas, será necessário rever a estrutura do setor.
— Provavelmente no segundo semestre será necessário um novo
aporte no setor, mas não podemos dizer que será por empréstimo, pode ser alguma
outra solução — disse uma fonte próxima à negociação que pediu para não ser
identificada.
Segundo esta fonte, a crise mostra que a política de
modicidade tarifária, que visava a aumentar a competitividade reduzindo o custo
da energia, se mostrou inviável.
— Há um temor de novos esqueletos para o setor elétrico —
disse a fonte.
Cláudio Pinho, membro do comitê de Petróleo e Gás do Instituto
dos Advogados do Brasil (IAB) e professor da Fundação Dom Cabral, lembra que o
empréstimo evidencia a necessidade de reformulação do o setor elétrico:
— O planejamento do Ministério de Minas e Energia para 2030
é baseado em dados de 2005. Na Empresa de Pesquisas Energéticas (EPE), os dados
são de 2008. Isso é anterior ao forte crescimento da demanda, anterior àcrise
mundial e à recuperação americana, baseada no uso do gás. Aqui, o planejamento
não leva em conta isso, o gás, regido pela Agência Nacional do Petróleo (ANP),
não é visto como fundamental para o setor de termelétricas.
O advogado lembra que este empréstimo é um “tapa-buraco”
para o setor, que pode ter mais déficits estruturais se não houver uma revisão
do marco regulatório:
—A relação das empresas é privadas, mas a estrutura da
tarifa ainda é estatal.
Segundo fonte, os bancos estariam finalizando as discussões
sobre o percentual de taxa de juros que será cobrada nos empréstimos, que
variou de 1% a 1,9%. Esta mesma fonte disse ainda que os bancos consideram o
socorro às distribuidoras um “excelente” negócio, com risco baixíssimo.
— A garantia são as contas de luz, conta que ninguém deixa
de pagar — destacou.
Dos cinco bancos procurados, apenas o Bradesco se
manifestou. Segundo o presidente do banco, Luiz Carlos Trabuco, a operação de
financiamento está sendo construída pelos bancos e terá estrutura e garantias
para que seja segura. TOMADO DE O GLOBO DE BR
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