Produção de machos
estéreis do Aedes aegypti deve começar em setembro
Expectativa de especialistas é que 12 milhões de machos
estéreis seja produzidos por semana Por: Agência Brasil Produção de machos
estéreis do Aedes aegypti deve começar em setembro MARVIN RECINOS/AFP Foto:
MARVIN RECINOS / AFP
Em meio ao cenário de epidemia do zika vírus na América
Latina e no Caribe, a Agência Internacional de Energia Atômica (Aiea) anunciou
esta semana que vai transferir ao Brasil a tecnologia necessária para
esterilizar machos do mosquito Aedes aegypti em uma tentativa de controle
populacional do vetor na região. O equipamento será enviado para a biofábrica
Moscamed Brasil, localizada na cidade de Juazeiro, região norte da Bahia. A
instituição foi escolhida pela própria agência de energia nuclear das Nações
Unidas e será a primeira biofábrica do mundo a utilizar a tecnologia de raios-x
para esterilização de insetos e controle biológico de pragas. Em entrevista, o
doutor em radioentomologia pelo Centro de Energia Nuclear Aplicada à
Agricultura da Universidade de São Paulo (USP) e diretor-presidente da
Moscamed, Jair Virgínio, explicou que a chegada de um irradiador gama de
cobalto-60 vai permitir à biofábrica a produção de até 12 milhões de machos
estéreis do Aedes aegypti por semana. Uma vez superados os procedimentos de
desembaraço para a entrada do aparelho no país, sobretudo no que diz respeito
às normas técnicas para equipamentos nucleares, a expectativa é que a produção
em larga escala de machos estéreis seja iniciada até setembro. Já a liberação
dos mosquitos está prevista para começar até o final do ano - inicialmente, em
municípios com até 30 mil habitantes.
Segundo ele, a técnica a ser usada se assemelha a uma
espécie de controle de natalidade do mosquito.
— É sempre bom lembrar que o macho não pica as pessoas. Ele
se alimenta de substâncias açucaradas, como néctar e seiva. É a fêmea quem
precisa de sangue para maturar os ovos e colocá-los. E a fêmea do Aedes copula
uma única vez na vida — explica Jair Virgínio.
Leia abaixo os
principais trechos da entrevista com o especialista:
O Brasil tem o conhecimento
necessário para utilizar esse tipo de tecnologia?
Jair Virgínio: Na biofábrica de Juazeiro, já temos um
aparelho irradiador de raios-x que também foi doação da Agência Internacional
de Energia Atômica. O processo com o irradiador gama de cobalto-60 é o mesmo. O
que muda é a escala de produção, já que o irradiador de raio-x é um equipamento
menor, sem capacidade para a produção necessária no combate à população de
Aedes aegypti. Desde 2005, utilizamos a técnica de esterilização de insetos
para controle de praga, sobretudo em moscas-das-frutas.
Como será feita a liberação dos
machos estéreis do Aedes?
Jair Virgínio: O processo de soltura desses mosquitos ainda
está sendo discutido. Há a possibilidade de fazermos a liberação em ambiente de
forma terrestre e também de forma aérea. A primeira consiste na simples
abertura de recipientes que contenham os insetos. Imagine da seguinte forma:
dentro de um carro, o responsável vai abrindo uma espécie de Tupperware e
liberando o mosquito, já adulto e estéril. A segunda estratégia consiste na
utilização de helicópteros e drones para auxiliar na soltura.
Uma vez soltos, como esses machos
estéreis interferem no ambiente?
Jair Virgínio: A liberação desses mosquitos é semanal, sendo
que, a cada sete dias, liberamos exatamente a mesma quantidade. Vamos usar como
exemplo a proporção de dez machos estéreis para cada macho selvagem. Estamos
promovendo uma concorrência desleal, fazendo com que a probabilidade de
cruzamento com um macho estéril seja dez vezes maior que com um macho selvagem.
Na semana seguinte, a mesma quantidade de insetos é liberada. A concorrência,
agora, será de 20 para um. Desta forma, a possibilidade de acasalamento entre
um macho selvagem e uma fêmea selvagem vai diminuindo em escala exponencial. Em
cinco gerações, não havendo novas infestações, atingiríamos zero população
selvagem naquela localidade.
O macho, mesmo estéril, não
representa perigo à população?
Jair Virgínio: É sempre bom lembrar que o macho não pica as
pessoas. Ele se alimenta de substâncias açucaradas, como néctar e seiva. É a
fêmea quem precisa de sangue para maturar os ovos e colocá-los. E a fêmea do
Aedes copula uma única vez na vida. A técnica que vamos utilizar se assemelha a
uma espécie de controle de natalidade do mosquito. Funciona assim: vamos
produzir, em laboratório, machos estéreis. Em seguida, vamos liberar esses
insetos, que vão procurar fêmeas selvagens para acasalar. Os ovos que resultam
dessa cópula, entretanto, não conseguem eclodir e se tornam inviáveis. Eles não
chegam sequer a virar larvas.
Como será feita a seleção de
municípios que vão receber esses machos estéreis?
Jair Virgínio: Esse processo ainda está em discussão. O
Ministério da Saúde deve definir prioridades, levando em consideração
características como população, relevo e disponibilidade de recursos. Bahia e
Pernambuco, por exemplo, já fizeram um levantamento de cidades com surto de
dengue, Zika e febre chikungunya. A ideia é trabalhar com municípios de até 30
mil habitantes para que a gente tenha maior controle e monitoramento. O
processo é mais complexo em grandes áreas. À medida que conseguirmos sucesso,
vamos avançando para cidades maiores.
Uma única biofábrica dará conta de
conter a infestação de Aedes no Brasil?
Jair Virgínio: Não. Precisaríamos de muitas outras biofábricas
para atender todo o país. Mas vale lembrar que estamos falando de tecnologias
inovadoras e que precisam ser colocadas em escala para serem melhor analisadas.
Algumas cidades, por questões de relevo, tamanho e condição demográfica, por
exemplo, não teriam êxito com esse tipo de técnica. É preciso checar onde os
machos estéreis devem ser liberados e onde eles não devem ser liberados. Só
quem vai dizer isso para a gente é a experiência com esse programa. TOMADO DE
ZERO HORA DE RGS BR
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