PO Paloma Oliveto
Cientistas consideraram dois cenários, crianças e
adolescentes tão ou menos infecciosos que adultos, e chegaram aos mesmos
resultados(foto: AFP / STR)
Na semana em que o Governo
do Distrito Federal (GDF) decide sobre a volta às aulas presenciais e
quando boa parte do país
discute se é hora de reabrir as escolas, um estudo inglês aponta que, sem
uma testagem expressiva do vírus ativo, há um alto risco de uma nova e mais
agressiva onda de covid-19 no Reino Unido com a retomada das aulas. Ao
contrário do Brasil, onde a curva ainda é ascendente, os casos da doença estão
controlados, embora, na sexta-feira, o Ministério da Saúde tenha reconhecido um
surto em Manchester.
Publicado na revista The Lancet Child & Adolescent
Health, um dos artigos, da Universidade College Londres e da Faculdade de
Higiene e Medicina Tropical de Londres, fez a primeira estimativa sobre os
níveis de cobertura de testes necessários para que as escolas, fechadas desde março,
reabram em setembro sem o risco de uma nova epidemia. Para o estudo, os autores
usaram dados demográficos e epidemiológicos e modelaram diferentes cenários de
volta às aulas presenciais, incluindo tempo integral, meio período e rodízio de
alunos em semanas alternadas. Para cada situação dessas, os pesquisadores
estimaram três cenários de testes.
Segundo os autores, para evitar a segunda onda de covid-19
no Reino Unido, de 59% a 87% das pessoas com sintomas, dependendo do cenário,
devem fazer o teste de PCR, que detecta o vírus ativo, e o rastreamento e o
isolamento de contatos precisam ser monitorados. O modelo mostra que, no
cenário de aulas integrais, o retorno poderá ser seguro caso 75% dos indivíduos
infectados sejam diagnosticados e isolados, e 68% daqueles que tiveram contato
com esses doentes sejam identificados, ou 65%, na hipótese de meio período. Se
apenas 40% dos contatos pudessem ser rastreados, 87% (integral) e 78% (meio
período) de pessoas sintomáticas teriam de ser diagnosticadas e ficar em
quarentena.
“No entanto, se os níveis de testes diagnósticos e de
rastreamento de contatos caírem abaixo disso (40%) na população do Reino Unido,
a reabertura de escolas com o relaxamento gradual das medidas de bloqueio
provavelmente resultarão em uma onda secundária, que atingiria o pico em
dezembro de 2020 se as escolas abrirem em período integral, e em setembro e em
fevereiro de 2021 se um sistema de meio período fosse adotado em setembro”,
alerta o artigo. A nova epidemia poderá voltar mais forte, com taxa de
reprodução (quantas pessoas um infectado pode contaminar) até 2,3 vezes maior
da verificada nessa primeira onda.
Os autores esclarecem que consideraram as crianças e os
adolescentes tão infecciosos quanto um adulto. Como ainda não se sabe
definitivamente se isso é verdade, os pesquisadores refizeram os cálculos
considerando que esse potencial era de 50% em relação ao de pessoas com mais de
20 anos. Os resultados foram os mesmos. “É importante observar que nosso modelo
analisou os efeitos da reabertura escolar com o afrouxamento das restrições em
toda a sociedade, pois é provável que a reabertura ande de mãos dadas com mais
adultos voltando ao trabalho e com outras medidas. Portanto, nossos resultados
refletem um afrouxamento mais amplo do bloqueio, em vez dos efeitos da
transmissão exclusivamente nas escolas”, diz Jasmina Panovska-Griffiths,
epidemiologista da Universidade College Londres, que liderou o estudo.
Medida essencial
Para Jose David Urbaez, infectologista e diretor científico
da Sociedade de Infectologia do Distrito Federal, discutir a reabertura das
escolas em países onde a covid-19 está em queda, como a Inglaterra, é oportuno,
ao contrário do Brasil. “Com a curva em alta, é uma discussão totalmente sem
sentido. E a queda tem de ser consistente: duas semanas, sendo que todos os
dias os casos são menores”, observa. “O problema não são as crianças, que não
pegam a doença de forma tão intensa, com exceção de casos raríssimos. O
problema são os pais, professores, os funcionários, a quantidade de
deslocamentos. Esse vírus está à procura de pessoas”, diz.
Urbaez lembra que, até recentemente, havia dúvidas se o
fechamento das escolas colabora para a contenção da pandemia, já que esses
estabelecimentos foram suspensos ao mesmo tempo em que se impediu a abertura do
comércio, e muitos trabalhadores entraram em regime de teletrabalho. Contudo, o
infectologista cita um estudo publicado em 29 de julho na revista da Associação
Médica dos Estados Unidos, a Jama, que concluiu que essa medida foi essencial
para que a epidemia não fosse pior nos EUA.
O artigo observacional utilizou dados nacionais de casos e
óbitos entre 9 de março e 7 de maio. Os autores ajustaram os resultados para
considerar apenas a influência das escolas. Eles constataram que o fechamento
desses estabelecimentos foi associado a 62% menos casos e 58% menos óbitos do
que ocorreriam caso o ensino presencial tivesse sido mantido.
O oftalmologista pediátrico Tiago Ribeiro, do Visão Hospital
de Olhos, destaca que, mesmo que as medidas de distanciamento sejam tomadas nas
escolas, crianças pequenas terão dificuldade de manter o uso da máscara
adequadamente e, dificilmente, conseguirão ficar distantes umas das outras.
“Fico na dúvida se vai ser possível voltar tomando as medidas de segurança”,
diz. Jose David Urbaez preocupa-se também com as escolas públicas e de regiões
mais pobres: “Será que terão sabão, álcool, máscaras e protetores faciais
suficientes? Fora o teste de PCR, que nunca foi feito em massa no Brasil.”
Aluna do terceiro ano do ensino médio de uma escola
particular da Asa Sul, Isadora Rivadavia Barbosa de Oliveira, 17 anos, está há
cinco meses sem aulas presenciais e, mesmo perto de tentar uma vaga em uma
universidade, prefere não voltar agora. “Os números estão aumentando a cada dia
que passa. Se a gente voltar, vão aumentar mais. Alguns alunos pegam ônibus,
outros vão de Uber, pegam metrô… Tem uma série de fatores que, no momento, não
colaboram para a volta às aulas, fora que algumas escolas não têm estrutura
nenhuma para reabrir”, observa. A mãe da jovem, a advogada Eliana Márcia
Barbosa de Oliveira, 54 anos, conta que o colégio da filha consultou os pais
sobre as aulas presenciais. “No meu caso, falei que não concordaria. Minha mãe
tem 87 anos, tem pressão alta, diabetes, então, prefiro que as aulas continuem
on-line.”
TOMADO DE CORRERIO BRAZILIENSE
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