Crise argentina pode reduzir exportações Compradores
argentinos são responsável por 76% dos embarques de carros brasileiros, informa
Anfavea /ANTONIO SCORZA/AFP/JC A crise cambial na Argentina pode levar à
redução das exportações brasileiras de carros e peças para o país vizinho,
segundo avaliação de especialistas. Atualmente, a participação da Argentina nas
exportações brasileiras é de cerca de 8% e a maior parte é do setor de
veículos. De janeiro a abril, as exportações totalizaram US$ 74,299 bilhões.
Desse total, US$ 6,060 bilhões são referentes à Argentina. Dos produtos
exportados para a Argentina, cerca de 33% são automóveis. A Associação Nacional
dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) informou que ainda não tem
uma previsão de quanto podem cair as exportações com a crise. A associação
disse apenas que 76% das exportações do setor vão para a Argentina, seguido do
México (7%), Chile (5%), Uruguai (4%), Colômbia 3% e Peru (2%). O ex-secretário
de Comércio Exterior Welber Barral lembra que a Argentina é o principal
importador de produtos manufaturados no Brasil. "Os principais produtos
são automóveis e peças de carro. Evidentemente, uma crise na Argentina afeta
esses setores", disse. Para Barral, se a Argentina conseguir o empréstimo
no FMI, o nível de especulação cambial diminuirá, o que fará com que o país não
diminua muito as importações. Entretanto, Barral disse que o efeito da crise
argentina no Brasil deve ficar restrito a esse segmento, sem contagiar toda a
economia brasileira. "O Brasil tem reservas internacionais altas, inflação
relativamente sob controle. Então, o Brasil não está na mesma situação da
Argentina. Mas em termos de exportações, sim. O Brasil pode ser afetado pela
queda das exportações", disse. Segundo Barral, a competitividade do setor
automotivo brasileiro é maior na Argentina por conta do Mercado Comum do Sul (Mercosul).
"Os produtos brasileiros não pagam imposto de importação na
Argentina", explicou. Além disso, ele disse que o mercado argentino é
maior do que de outros países. "Enquanto na Argentina tem um mercado de 42
milhões de pessoas, no Uruguai, por exemplo, são 3 milhões", disse. A
pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio
Vargas (FGV) Lia Baker Valls Pereira também avalia que o efeito da crise
argentina no Brasil se restringirá à balança comercial. "No Brasil, a exportação
não é o principal elemento do PIB (Produto Interno Bruto, soma de todos os bens
e serviços produzidos no país). A Argentina é a terceira importadora do Brasil.
É muito localizado, afetaria mais a exportação de automóvel", avaliou a
pesquisadora. "O empréstimo do FMI vem cheio de restrições. A Argentina
tem um problema de déficit fiscal, déficit externo, tem inflação alta. A
Argentina vai se comprometer a um controle inflacionário e fiscal mais
austero", disse. Lia acrescentou que o presidente argentino Entenda o problema O aumento do dólar no
mercado internacional fez o Banco Central da Argentina (BCRA) elevar, por três
vezes em uma semana, a taxa de juros até 40% ao ano, desencadeando uma série de
reações no país. Os argentinos vivem momentos de apreensão, pois com a economia
atrelada ao dólar, a tendência é de disparada de preços, perda do poder de
compra e especulações. Ao mesmo tempo, o governo de Mauricio Macri busca apoio
internacional para conter as dificuldades internas e aprovar a reforma
trabalhista, adiada desde o começo do ano. Apesar das semelhanças com o Brasil,
a Argentina tem uma inflação elevadíssima, que varia entre 20% e 24% ao ano,
perdendo apenas para a Venezuela na América Latina. O clima de incerteza domina
os principais setores do país. As centrais sindicais convocaram para o próximo
dia 28 o início de uma temporada de mobilizações denominada "Plano de
Luta", na tentativa de resistir a eventuais reajustes de tarifas dos
setores de públicos, como energia elétrica, água e gás. Paralelamente, atuam ao
lado de organizações sociais em favor de uma proposta da oposição que limita os
aumentos das tarifas. Argentinos temem colapso econômico como em 2001 Notícia
de negociação com o FMI causou protestos em Buenos Aires EITAN
ABRAMOVICH/AFP/JC O anúncio do presidente da Argentina, Mauricio Macri, na
terça-feira, de que seu governo está conversando com o Fundo Monetário
Internacional (FMI) para receber um financiamento resultou em protestos e
panelaços em Buenos Aires contra o acordo. Mas a negociação com o FMI trouxe
para a população lembranças de um dos períodos mais difíceis da história
recente do país: o colapso econômico de 2001. O aposentado Francisco Bebeacua
lembra que, na época, todo o dinheiro que tinha em sua poupança - US$ 5 mil -
foi retido pelo governo, em uma tentativa do presidente Fernando de la Rúa de
impedir a fuga de capitais. Parte dos primos de Bebeacua perdeu o emprego e sua
filha mais velha, então com 22 anos, deixou o país para nunca mais voltar. Sem
a perspectiva de um futuro, ela foi viver na Europa. "Foi um pesadelo.
Houve gente que se suicidou porque a poupança de toda uma vida havia sido
confiscada. Tenho medo do que vai acontecer na Argentina agora. Nenhuma empresa
vai aguentar uma taxa de juros de 40%", diz o aposentado. A situação
daquela época era diferente da atual, frisa a maioria dos economistas. Enquanto
entre o fim da década de 1990 e o início dos anos 2000 foram quatro anos de
recessão, hoje a Argentina vem de uma expansão do Produto Interno Bruto (PIB)
de 2,9% no ano passado, e a alta esperada pelo próprio FMI para este ano é de
2%. "O governo está em uma situação complicada: a inflação não cede e o
mercado pôs em dúvida o financiamento internacional do país. Mas não se compara
com 2001", diz o economista Ramiro Castiñeira, da consultoria argentina
Econométrica. Os argumentos de Castiñeira, porém, não são suficientes para
convencer a mulher de Bebeacua, a professora aposentada Graciela Cingolani.
"O que estamos vivendo agora pode não ser igual a 2001, mas os primeiros
passos são os mesmos. Salvo que uma variável mude, vamos pelo mesmo
caminho", argumenta. Graciela se refere justamente ao pedido de ajuda ao
FMI feito por Macri. Em dezembro de 2000, De la Rúa pegou um empréstimo com o
FMI e outros organismos internacionais de cerca de US$ 40 bilhões, em uma
medida batizada de "blindagem financeira". A ideia era que os
recursos servissem para pagar dívidas do país e aumentassem a confiança no
mercado financeiro. Já a solicitação de Macri foi chamada, pelo seu ministro da
Fazenda, Nicolás Dujovne, de "financiamento preventivo" e também
deveria dar ao país credibilidade internacional, fazendo com que a moeda
argentina, o peso, deixasse de perder valor. A Argentina é o país que vem sendo
mais prejudicado pela valorização do dólar no mercado internacional, com as
perspectivas de um aumento maior dos juros nos EUA - o que torna o mercado
americano mais atraente aos investidores e afeta diretamente os países
emergentes. Além desse cenário externo desfavorável, a perda de credibilidade
do Banco Central após o relaxamento da meta de inflação de 10% para 15% neste
ano, a criação de um imposto sobre ganhos financeiros de investidores
estrangeiros e a avaliação de que os déficits das contas públicas e externo
continuam altos ajudaram a desencadear a crise no país. A turbulência
financeira culminou com uma fuga de capital que desvalorizou o peso em 12%
neste mês. -
Mauricio Macri
optou por fazer um ajuste gradual na economia, mas não conseguiu. No último dia
8, o ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, afirmou não há possibilidade de
"contágio" da crise argentina no Brasil. "Nós temos uma situação
externa extremamente confortável, um déficit em conta-corrente pequeno, que é
financiado por investimentos diretos estrangeiros. Temos reservas extremamente
elevadas, de US$ 383 bilhões. Não vejo nenhum impacto. A situação (do Brasil) é
completamente diferente da Argentina", disse. População vê medidas
implementadas pelo governo com muita desconfiança Antes de recorrer ao FMI, o
governo Macri tentou segurar a cotação da moeda vendendo reservas
internacionais - já foram US$ 8 bilhões nas últimas semanas, tendo sobrado US$
54,4 bilhões -, elevando a taxa básica de juros três vezes em oito dias,
chegando a 40% ao ano, e reduzindo a meta do déficit fiscal de 3,2% para 2,7%
do Produto Interno Bruto (PIB). O mercado, porém, continua bastante volátil.
Graciela Cingolani afirma achar difícil que Macri consiga convencer os
investidores a deixarem seu dinheiro no país, já que membros do próprio governo
mantêm recursos fora. Segundo dados da Receita argentina, do patrimônio total
do alto escalão do governo, 43% estão no exterior. "Que segurança tem um
país onde os ministros mantêm seu dinheiro fora?", questiona a aposentada.
Ela e o marido também estão entre a grande parte dos argentinos que não
acredita no sistema bancário nem na moeda do país: a poupança do casal é em
dólares, escondida dentro de casa. "Depois de 2001, não confiamos em
banco." Apesar de não terem vivido a última grande crise argentina, jovens
também veem com desconfiança o pedido de ajuda ao FMI. Magali Kerzenblat, de 20
anos, estudante de Ciências Atuariais, afirma achar arriscada a medida, pois o
empréstimo do fundo virá com exigências em relação à economia da Argentina -
possivelmente, metas para a dívida pública. "Nossa independência externa
pode ser prejudicada." A estudante de contabilidade pública Estefania
Pingarro, de 22 anos, acredita que o momento atual da economia argentina é
diferente do de 2001, mas lembra que há uma espécie de trauma no país.
"Essa tensão (da população) tem a ver com nossa história. Sempre que
fizemos uma dívida com o FMI, nos demos mal." Estefania não se lembra da
crise de 2001, que levou 57,5% da população à pobreza. Tinha apenas cinco anos
quando a Argentina deu um calote de cerca de US$ 100 bilhões - um dos maiores
da história -, mas sabe que seus pais perderam tudo o que tinham poupado até
então: o suficiente para comprar um imóvel. A compra da casa própria teve de
ser adiada por 10 anos. A estudante, que ainda é professora de hóquei, também
já poupa em dólares. Escalada da inflação está preocupando os comerciantes em
Buenos Aires Desde o começo deste mês, o argentino Pablo Toledo, de 52 anos,
tem atualizado um caderninho diariamente. Nesse caderno, ele anota o preço dos
instrumentos musicais vendidos na loja em que trabalha, na rua Sarmiento,
tradicional ponto de comércio do gênero em Buenos Aires. "Foi de um
momento para o outro (que começou a ter de atualizar os preços rapidamente).
Agora passo o tempo alterando preços, constantemente", conta. Segundo
Toledo, essa mudança em seu cotidiano se deu em abril e se intensificou agora,
em maio, numa tendência que acompanha a desvalorização do peso. Neste mês, em
apenas 11 dias, a moeda argentina já perdeu 12,16% de seu valor. No ano, chega
a 23% e, nos últimos 12 meses, são 49%. O resultado disso no cotidiano dos
argentinos é que os importados estão cada vez mais caros, e essa inflação dos
produtos vindos de fora tem se espalhado por toda a economia. Toledo conta que
os fornecedores têm repassado o preço dos itens aos poucos. "De uma lista
de 500, primeiro aumentam uns 50 produtos. No outro dia, outros 50",
acrescenta. Nos últimos 40 dias, o preço dos produtos vendidos por Toledo subiu
entre 15% e 20% - ajuste que foi repassado ao consumidor. Um violão montado
localmente, mas cujas partes vêm da China, por exemplo, custava 5.700 pesos
(cerca de R$ 890,00) na semana passada e agora está por 7.000 pesos (R$ 1,1
mil), alta de 22,8%. No bairro San Telmo, Mario Pereira, dono de uma loja de
ferramentas, conta que seus fornecedores lhe avisaram na quarta-feira, dia 9,
que, a partir desta segunda-feira, 14, os produtos serão reajustados entre 10%
e 15%. "Vou repassar o aumento só das ferramentas mais simples, mais
baratas. As máquinas (como furadeiras) já estão saindo muito pouco. Se aumentar
o preço, ninguém leva", diz. Uma grande parte dos itens comercializados
por Pereira é importada, mas, segundo ele, até os nacionais já estão sendo
reajustados no mesmo patamar. "Aqui, na Argentina, tudo sobe quando o
dólar sobe", acrescenta. Até as sacolinhas plásticas que compra para
colocar os produtos vendidos foram reajustadas em 17%. Inflação alta não é
novidade na Argentina - quase sempre está acima dos 20%. No primeiro ano do
governo de Mauricio Macri, em 2016, chegou a 40,3%, após uma desvalorização
inicial de 40% do peso. No ano passado, a inflação foi de 24% e, para 2018, as
projeções eram de 20% no começo do ano. Diante da desvalorização da moeda do
país, entretanto, economistas afirmam estar revendo esse número. A consultoria
Abeceb, por exemplo, deverá divulgar sua nova estimativa na quarta-feira.Jornal do Comércio (http://jcrs.uol.com.br/_conteudo/2018/05/economia/627038-crise-argentina-pode-reduzir-exportacoes.html) tomado de journal do comercio de rgs br
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