Com a tecnologia de edição do genoma Crispr, pesquisadores
dos Estados Unidos conseguiram classificar quase 4 mil variantes do gene BRCA1
PO Paloma Oliveto
foto: Chris Bickel/Science Translational Medicine)
Testes para identificação de mutações genéticas no
BRCA1 estão cada vez mais comuns e acessíveis. Com o resultado em mãos, médicos
podem descartar o risco de malignidade em pacientes com histórico familiar que
sugerem a possibilidade de câncer de mama ou ovário. Contudo, dos milhares de
variantes conhecidos desse gene, muitos ainda se encontram em um limbo
diagnóstico. Não se sabe se têm ou não potencial para silenciar a função
natural de reparação do DNA e, assim, evitar ou facilitar a disseminação de
células tumorais.
Com a tecnologia de edição do genoma Crispr, pesquisadores
da Universidade de Washington em Seattle, nos Estados Unidos, conseguiram
classificar, de forma rápida e com acurácia, quase 4 mil variantes do BRCA1 em
apenas seis meses. A expectativa da equipe é de, nos próximos dois anos,
identificar, em todas as mutações conhecidas desse gene, o potencial maligno ou
benigno e, assim, orientar pessoas que, hoje, não sabem se tomam iniciativas
profiláticas, como a remoção das mamas, ou esperam o câncer se manifestar.
“Devido ao histórico
familiar de câncer de mama ou ovário, é comum mulheres fazerem o teste para
mutações no BRCA1, mas ter uma variante e não saber o que ela significa é muito
estressante”, observa Jay Shendure, pesquisador do Departamento de Ciências
Genômicas da Universidade de Washington e autor sênior de um artigo sobre a
técnica, publicado na revista Nature. De acordo com ele, atualmente milhares de
mutações encontram-se na categoria das variantes de significado desconhecido,
quando é impossível dizer se podem ou não causar câncer.
Banco internacional
O oncologista Sergio Simon, presidente da Sociedade
Brasileira de Oncologia Clínica (Sboc), explica que, hoje, a principal
ferramenta para a classificação de mutações do BRCA1 é um banco de dados
internacional, o Brotman Baty, no qual, há duas décadas, médicos e laboratórios
de genética inserem informações sobre aquelas encontradas em pacientes. Uma
delas foi descoberta por Simon em uma família paquistanesa que vive no Brasil.
Em dois anos, foram 15 casos registrados de pacientes com a
mutação maligna. Quando não se sabe se a variante pode desencadear o câncer, é
preciso esperar a doença se manifestar para, então, informar à comunidade
científica sobre a classificação da versão do gene. “Com os relatos de casos,
vai ficando mais claro se a mutação é patogênica. Mas esse é um processo muito
demorado”, diz.
Com a tecnologia desenvolvida por um estudante de PhD do
laboratório de Jay Shendure, não será preciso esperar os geneticistas inserirem
mutações no banco de dados, nem a doença surgir para se saber se elas podem
provocar o câncer. Dessa forma, pacientes com alterações hoje identificadas
como desconhecidas já não ficarão sem orientações sobre o procedimento mais
indicado. “Agora, podemos fazer interpretações com confiança. E isso apenas em
um gene, mas, talvez, possamos pegar o mesmo paradigma e estendê-lo a outros genes”,
afirma Shendure.
Alta acurácia
A técnica do pesquisador Greg Finley foi batizada de edição
genômica de saturação e consiste no uso da enzima Crispr, que, como uma
tesoura, corta pedaços do DNA para modificar as sequências. Usando essa
ferramenta, os pesquisadores fizeram diversas alterações no BRCA1, inclusive
algumas ainda não identificadas em humanos, e mediram os efeitos de cada uma
delas em células humanas cultivadas em laboratório. Os cientistas ficaram
surpresos com o grau de acurácia do método, que identificou corretamente
mutações sabidamente malignas e benignas.
Uma das vantagens destacadas por Finley é poder fazer a
avaliação de um grande número de variantes em um curto espaço de tempo. “Para
testar quase 4 mil mutações, levamos cerca de seis meses. Acreditamos que, em
dois anos, conseguiremos classificar todas as mutações do gene BRCA1”, diz
Finley. “Nossa esperança é de que o banco de dados Brotman Baty continue a
crescer e se torne um ponto central para guiar a interpretação das variantes.”
O presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica destaca que esse
prazo é um avanço muito grande em relação ao que se tem hoje. “Essa técnica vai
clarificar cada vez mais os testes genéticos, esclarecendo resultados que,
agora, ainda são um ponto de interrogação”, avalia Sergio Simon. // TOMADO DE
CORREIO BRAZILIENSE
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