Um ano após emergência por microcefalia, incertezas sobre
o zika reforçam importância da prevenção
Ciência ressalta a importância dos cuidados com a
proliferação do mosquito transmissor de zika e outras doenças
Por: Jéssica Rebeca Weber Foto: Diego Vara /
Agencia RBS
Com diversas pesquisas nacionais e internacionais em
andamento para o descobrimento de uma vacina ou tratamento específico para as
infecções por zika
vírus, um ano após o Ministério da Saúde decretar Estado de Emergência
em Saúde Pública em todo o território nacional em função do número alarmante de
casos de microcefalia em Pernambuco, cientistas estudam a possibilidade de que
a malformação em que o perímetro cefálico é menor do que o normal seja apenas a
"ponta do iceberg".
— Há casos de crianças que nasceram com perímetro cefálico
normal, mas com alterações neurológicas marcantes e crescentes logo depois do
nascimento, como, no sistema visual, na medula espinhal e nos neurônios que
controlam o músculo — explica Stevens Rehen, pesquisador do Instituto D'Or de
Pesquisa e Ensino, comentando também que, em adultos, o vírus também foi
relacionado a casos de síndrome de Guillain-Barré.
Um dos catalisadores da esperança de encontrar um tratamento
contra o vírus foi uma das descoberta anunciada em estudo publicado na última
segunda-feira. Um anticorpo produzido pelo corpo humano foi capaz de proteger
fetos de ratas grávidas contra o zika. Nos experimentos em laboratório, ele
neutralizou todas as cepas conhecidas do zika e reduziu
"visivelmente" os níveis dos vírus nos roedores infectados e nos seus
fetos.
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Outra descoberta importante está relacionada com a forma de
transmissão do vírus: o Aedes é o principal vetor, mas a doença pode ser
transmitida também por relações sexuais. Em março, autoridades sanitárias dos
EUA recomendaram que homens diagnosticados com o zika vírus ou que apresentaram
sintomas da doença deveriam esperar seis meses antes de ter relações sexuais
sem proteção.
— Ele consegue estar ativo no sêmen por mais de 90 dias —
diz Amilcar Tanuri, chefe de virologia molecular da Universidade Federal do Rio
de Janeiro (UFRJ).
Cientistas ainda trabalham na elaboração de vacinas e
medicações para o tratamento do zika. Tanuri destaca que é necessário redobrar
o cuidado por se tratar de drogas que serão dadas a gestantes.
Para agilizar, pesquisadores estudam remédios que já existem
e protegem os neurônios. Uma pesquisa recente mostrou que um remédio contra
Alzheimer pode impedir que o vírus ataque o cérebro do feto e cause a
microcefalia.
O Instituto Butantan também iniciou a pesquisa de um
medicamento para tratar pessoas infectadas com zika vírus. Ela vai adotar como
métodos o reposicionamento de fármacos e a triagem de alto conteúdo. Essas
tecnologias permitem que coleções de compostos químicos sejam triadas contra o
vírus em células humanas infectadas.
Os muitos desafios da ciência pela frente reforçam a
importância da prevenção e de cuidados com a proliferação do mosquito
transmissor de zika e outras doenças.
Quando o vírus despontou no país
Em 11 de novembro de 2015, dia em que o Ministério da Saúde
decretou a situação alarmante de forma oficial em todo o país em razão do
número em elevação de casos de microcefalia em Pernambuco, haviam sido
notificados até então 141 casos, número 15 vezes maior do que a média de anos
anteriores. A relação da malformação congênita com a contaminação de gestantes
pelo zika vírus era, na época, apenas uma hipótese aterradora.
— Não há registros de uma situação como essa na história
recente — afirmou, na data, o então diretor do Departamento de Vigilância de
Doenças Transmissíveis do ministério, Cláudio Maierovitch.
Pesquisadores de diversas áreas mobilizaram-se até constatar
que o aumento dos casos de microcefalia está relacionado a um vírus transmitido
principalmente pelo mosquito Aedes aegypti, o mesmo que dissemina dengue,
chikungunya e febre amarela. O zika se tornava o novo vilão da saúde nacional,
que também levaria a Organização Mundial da Saúde (OMS) a decretar
"emergência pública internacional" em fevereiro.
A primeira a estabelecer a ligação entre o zika e os casos de
microcefalia em bebês nascidos de mães infectadas foi a especialista em
medicina fetal Adriana Melo. Embora faltem recursos para pesquisa, ela destaca
que o Brasil nunca fez tantas publicações internacionais importantes. Mas ainda
há muitas perguntas.
— Uma delas é por que uns fetos são protegidos e outros não.
A gente sabe que nem todo mundo que tem zika vai ter bebê com alterações —
ressalta.
— Será que tem cofatores associados? Será que a infecção
junto à outra infecção pode piorar, ou com fatores nutricionais? Quais fatores
diminuiriam uma consequência pior? Por que, às vezes, no mesmo período de
infecção, as consequências para o bebê são muito diferentes? — complementa a
pesquisadora do Instituto D'Or Fernanda Tovar Moll.
Nestes 365 dias, o que já se descobriu?
Além da transmissão pelo mosquito, conseguiu-se demonstrar
que ele pode passar sexualmente. No homem, consegue estar ativo no sêmen por
mais de 90 dias, de acordo com Amilcar Tanuri, chefe de virologia molecular da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Estudos dão conta de que o vírus
também pode ser encontrado de forma ativa na saliva e na urina, embora ainda
não se tenha comprovada a transmissão dessa forma.
Cientistas brasileiros que comprovaram, no começo do ano,
que o zika vírus tem capacidade para infectar e matar células neuronais
humanas, agora mapeiam proteínas que são alteradas pelo vírus zika na célula
neural afetada. Eles apontam para a possibilidade de células infectadas pelo
vírus "se suicidarem".
— É como se o vírus sequestrasse a célula e fizesse ela
produzir proteínas para ele se replicar. Já identificamos que o zika causa
lesões no DNA, e, quando isso acontece, a célula tenta criar mecanismo de
reparo. Se a lesão for muito grande, ela desiste de tentar consertar e prefere
se matar — diz o coordenador de pesquisa do Instituto D'Or de Pesquisa e Ensino
(IDOR) professor da UFRJ Stevens Rehen, explicando que, com a perda de muitas
células, ocorrem alterações como a microcefalia.
Além de microcefalia, estudos apontam que o vírus pode gerar
outras alterações cefálicas importantes. Por isso, por mais que a tomografia ou
ultrassom não tenham apontado anormalidades, ainda é preciso manter um
acompanhamento da criança para verificar se a maturação e o crescimento pós
natal vão ser normais, de acordo com a pesquisadora do Instituto D'Or Fernanda
Tovar Moll. Em adultos, o vírus também foi relacionado a casos de síndrome de
Guillain-Barré, doença autoimune rara, que geralmente se desenvolve após
infecções bacterianas e virais.
De onde veio
- O vírus foi descoberto em 1947, em uma floresta chamada
Zika, em Uganda. Foi identificado em mosquitos Aedes aegypti da região.
- Antes de 2007, eram raras as ocorrências fora da África. Naquele ano, na Micronésia, a ilha de Yap, com população de 7,3 mil habitantes, segundo levantamento de 2000, foi tomada pelo vírus e cerca de 70% da população foi infectada.
- Entre 2013 e 2014, uma epidemia de zika começa na Polinésia Francesa e se espalha para outras ilhas do Pacífico.
- Antes de 2007, eram raras as ocorrências fora da África. Naquele ano, na Micronésia, a ilha de Yap, com população de 7,3 mil habitantes, segundo levantamento de 2000, foi tomada pelo vírus e cerca de 70% da população foi infectada.
- Entre 2013 e 2014, uma epidemia de zika começa na Polinésia Francesa e se espalha para outras ilhas do Pacífico.
- Foram levantadas hipóteses de que o vírus tenha chegado ao
Brasil com o fluxo intenso de turistas na Copa do Mundo de 2014 ou adurante uma
competição internacional de canoagem, quando atletas da Polinésia Francesa
vieram para o Rio de Janeiro em agosto. Informações mais recentes, publicadas
na Science, dão conta de que o vírus desembarcou em solo brasileiro em algum
momento entre maio e dezembro de 2013, possivelmente durante a Copa das
Confederações.
Floresta chamada Zika, em UgandaFoto: ISAAC KASAMANI / AFP
No verão, afaste o mosquito
Infectologista e coordenador do Centro de Imunizações do
Hospital Moinhos de Vento, Paulo Gewehr afirma que, em função de fatores como o
clima menos propenso para a reprodução do Aedes aegypti durante boa parte do
ano, o Rio Grande do Sul tem números baixos em comparação com outros Estados —
Sudeste e Nordeste são as regiões mais atingidas. Mas destaca que isso não nos
põe em uma situação tranquila: especialmente a partir deste mês, com a
aproximação do verão, é necessário trabalhar forte para eliminar os criadouros
de mosquito.
Desde outubro do ano passado, o Ministério da Saúde informa
que, até 29 de outubro de 2016, foram confirmados 2.106 casos de microcefalia e
outras alterações do sistema nervoso, sugestivos de infecção congênita.
Permanecem em investigação 3.091 casos suspeitos de microcefalia em todo o
país. Do total de casos confirmados, 405 tiveram confirmação por critério
laboratorial específico para o vírus. A pasta, no entanto, ressalta que esse
dado não representa adequadamente a totalidade do número de casos relacionados
ao vírus e considera que houve infecção pelo zika na maior parte das mães que
tiveram bebês com diagnóstico final de microcefalia.
Neste mesmo período, o RS registrou dois casos confirmados
de microcefalia associados ao zika, em residentes em Esteio e Cachoeira do Sul.
Segundo a Secretaria Estadual de Saúde, ambas as mães apresentaram quadro de
doença compatível com infecção pelo vírus no primeiro trimestre da gestação por
ocasião de viagem a locais com circulação da doença fora do Estado. Mas o
Estado também já registrou 44 casos autóctenes (contraídos no local de origem)
de zika neste ano — de um total de 85 confirmados, 44 foram adquiridos no RS.
Gestantes, zika e microcefalia
- Precauções: especialistas recomendam o uso de mangas
longas e calças compridas, mosquiteiros e repelente. Não há necessidade de
medidas drásticas, como isolamento, mas, nos horários de maior risco de picada
do Aedes (do nascer do sol até as 8h e no entardecer, entre 17h e 21h), a
gestante deve evitar sair de casa.
- Repelentes: podem ser usados por grávidas, mas é
necessário seguir a recomendação de cada produto sobre o tempo de aplicação. A
proteção dura, em média, de quatro a oito horas, dependendo da quantidade da
substância na composição. Em excesso, os repelentes podem causar intoxicação.
- Identificação: a picada do Aedes aegypti não deixa lesões
distintas na pele. Se o mosquito transmitiu zika, chikungunya ou dengue, apenas
um exame pode comprovar. Em alguns casos, as infecções não apresentam sintomas,
mas quem tiver febre, manchas avermelhadas pelo corpo, dores nas juntas e
fraqueza deve procurar atendimento médico.
- Sintomas: se uma gestante apresentar sintomas do zika, a
instrução é procurar imediatamente uma unidade de atendimento médico para exames
e avaliação. Se for confirmada a infecção pelo zika vírus, a gestante deverá
seguir as orientações dos médicos.
TOMADOD E ZERO HORA DE RGS BR
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