Cem entidades denunciam Brasil na ONU por morte de
Marielle
Nações Unidas qualificaram situação no País como
'sombria' e deputados europeus também protestaram em Bruxelas
Jamil Chade, O Estado de S.Paulo
Vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) foi morta a tiros na
noite de quarta-feira, 14 Foto: EFE/Mario Vasconcellos/CMRJ
GENEBRA - Mais de cem ONGs e entidades internacionais se
uniram para denunciar o estado brasileiro na ONU e pediram investigações
independentes sobre a morte da vereadora carioca Marielle Franco.
Numa intervenção durante o Conselho de Direitos Humanos
da ONU nesta terça-feira, 20, o bloco denunciou o fato de que "muitos que
falam a verdade ao poder no Brasil enfrentam violência e estigmatização sem
precedentes".
O protesto ocorre no mesmo dia em que deputados europeus
cobram respostas do governo brasileiro e que a ONU critica pela segunda vez em
uma semana a situação de ativistas no País.
Em Genebra, a lista das entidades que apoiam a declaração
na ONU inclui Conectas, Organização Mundial contra a Tortura, Front Line
Defenders, Friends of the Earth, Conselho Indígena Missionário, além de
entidades africanas e latino-americanas.
"Solicitamos ao governo brasileiro assegurar uma
investigação imediata, imparcial e independente, processando os responsáveis
materiais e intelectuais deste crime, com a competência e a abertura para a
possibilidade de o assassinato ter sido uma execução extrajudicial",
declarou o grupo, em um texto lido pela estudante de mestrado brasileira
Mariana Tavares.
"Também pedimos para as autoridades dar proteção
efetiva aos sobreviventes desse ataque, como testemunhas-chave desta
atrocidade", pedirão.
Manifestantes vãos às ruas do País após morte de Marielle
e Anderson
Segundo o grupo, o ataque ocorre "no contexto de uma
intervenção federal altamente militarizada no Estado do Rio, decretada pelo
presidente, contrários à vontade das comunidade locais". "De fato, as
preocupações sobre a intervenção foram destacadas pelo alto comissário (da ONU)
em sua declaração durante esta sessão", afirmou Mariana, numa referência
às críticas feitas pela ONU há duas semanas.
No Rio, homenagem à Marielle Franco vira ato contra
intervenção
"Muitos que falam a verdade ao poder no Brasil
enfrentam violência e estigmatização sem precedentes, já que o Pestá no topo
das mortes dos defensores. Marielle e Anderson foram mortos a tiros no carro,
retornando de uma rodada de debate com mulheres negras. Marielle foi nomeada
relatora de um comitê parlamentar para supervisionar os abusos da ação militar
no Rio. O programa de proteção dos defensores permanece subfinanciado e
insuficiente", complementou.
Grupos organizam
protestos no Rio, em SP e em BH por morte de vereadora
Outro lado
Em resposta, o governo brasileiro afirmou que está
"comprometido em investigar" o caso e levar os autores diante da
Justiça. O Itamaraty indicou que o assassinato é ainda um "atentado contra
a democracia e estado de direito".
"O governo federal vai dar total apoio às autoridades estaduais nas
investigações sobre o crime" disse a chanceleria, que indicou que a
Polícia Federal está "pronta para contribuir com as investigações". O
governo ainda a qualificou como uma "voz importante e respeitada" na
luta pelos direitos humanos.
Sombrio Nesta terça-feira, a ONU voltou a comentar o
crime. Num e-mail ao Estado, o órgão das Nações Unidas indicou que
"continua a monitorar a evolução do caso (de Marielle) e está em contato
com autoridades locais e regionais, em linha com nosso mandato".
Para a ONU, porém, o caso da vereadora é sintoma de um
problema mais amplo. "Infelizmente, o caso de Marielle Franco ocorre em um
contexto mais amplo caracterizado por uma situação sombria para defensores de
direitos humanos no Brasil", indicou a entidade.
Informes de diferentes entidades, como Anistia
Internacional, apontam o Brasil como o local mais perigoso para o trabalho de
ativistas.
De acordo com o escritório da ONU, a situação foi alvo de
reuniões entre a entidade e o governo brasileiro. "Em vários diálogos com
as autoridades nacionais e, também publicamente, temos levado nossa preocupação
sobre a intimidação e violência que defensores de direitos humanos
frequentemente sofrem no País, incluindo vários assassinatos", apontou a
entidade, num e-mail assinado pela porta-voz, Ravina Shamdasani.
"Esperamos aumentar a colaboração com as autoridades
brasileiras para lidar com esse problema de direitos humanos de forma
urgente", completou.
Europeus
Enquanto em Genebra as entidades denunciam o
estado brasileiro, a morte de Marielle foi uma vez mais mencionada por
deputados europeus.
Numa declaração conjunta entre os diferentes comitês do
Parlamento Europeu, os deputados "condenam" o assassinato de
Marielle.
"Pedimos às autoridades brasileiras e à Justiça
brasileira que conduzam investigações imediatas, completas e transparentes
sobre o assassinato de Marielle Franco para identificar todos os responsáveis e
os levar a um tribunal independente", apelam os europeus.
"Também pedimos que as autoridades no Brasil
garantam a integridade física e psicológica de defensores de direitos humanos
no Brasil", completam.
O documento é assinado pelos deputados Ramón Jáuregui
Atond, Fernando Ruas,Francisco Assis e Elisabetta Gardini, líderes de
delegações dentro do Parlamento Europeu responsável por relações com a América
Latina e sobre direitos das mulheres.
Além das três delegações do Parlamento, a Comissão de
Direitos Humanos do órgão europeu emitiu um comunicado. "Marielle era a
voz das pessoas mais vulneráveis, marginalizadas e estigmatizadas", disse
o deputado Pier Antonio Panzeri, chefe dessa comissão. "Ela foi uma das
mulheres mais valentes de sua geração e decidida que nunca teve medo de
denunciar a corrupção endêmica, os abusos policiais e execuções sumárias."
"Esse assassinato político covarde não pode ficar
impune", apontou o deputado.
Na quarta-feira, os parlamentares europeus ainda se
reunirão com diferentes organizações brasileiras para abordar a situação da
violência e "exigir responsabilidades do governo Temer". Os
representantes do partido Podemos chegaram a pedir a suspensão das negociações
entre Mercosul e Europa.
"Continuamos pedindo que a Europa exija do Brasil
uma investigação rápida, objetiva e transparente", afirmou Xabier Benito,
vice-presidente da Delegação do Mercosul no Parlamento Europeu. "A
impunidade desses crimes tem de acabar. Eles não são uma casualidade. Mas a
consequência da repressão sistemática que sofrem os defensores de direitos
humanos na América Latina."
Estefanía Torres, outra deputada europeia, aponta que o
Brasil vive uma "situação de alarmante retrocesso democrático". Para
ela, a UE não está interessada em se pronunciar. Tomado de ESTADÃO sugerido en
face
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