Diminuir a atividade mental em área ligada ao autocontrole
aumenta a ingestão de alimentos calóricos, mostra estudo canadense com 28
voluntárias. A descoberta poderá ajudar na criação de tratamentos contra a
obesidade e a bulimia
VS Vilhena Soares (foto: Valdo Virgo/CB/D.A Press)
Um dos maiores esforços de cientistas é encontrar maneiras
de evitar o consumo de alimentos calóricos e, de quebra, as consequências
geradas por esse hábito. Seguindo esse objetivo, pesquisadores canadenses
descobriram que o uso da estimulação magnética transcraniana (EMT) aumenta
temporariamente o desejo por alimentos gordurosos em humanos. Segundo eles, o
resultado do experimento feito com mulheres aprofunda o conhecimento sobre os
mecanismos cerebrais ligados a complicações como obesidade e compulsão
alimentar e poderá ajudar no desenvolvimento de abordagens terapêuticas.
Participaram da pesquisa 28 jovens saudáveis, mas que
relatavam sentir desejo frequente por consumir alimentos com alto teor
calórico. Quando, usando a EMT, foi diminuída temporariamente a atividade no
córtex pré-frontal dorsolateral — a rede cerebral responsável pelo autocontrole
—, 89% das participantes passaram a consumir mais alimentos calóricos, se
comparado ao resultado das sessões de estimulação placebo.
As mulheres também foram convidadas a avaliar uma série de
refeições após serem submetidas à EMT. A maioria classificou lanches altamente
calóricos de forma positiva, prestou mais atenção a imagens atraentes desses
alimentos e relatou impulsos maiores para comê-los. “Isso resultou também em
mais consumo quando lhes foi dada a oportunidade de experimentá-los”,
complementa Peter Hall, professor na Universidade de Waterloo e um dos autores
do estudo.
Hall conta que ele e a equipe têm estudado os processos
cerebrais em autocontrole há anos e que a intervenção experimental foi o passo
lógico do trabalho. “Nossos estudos anteriores usaram a mesma técnica para
suprimir a atividade cerebral no córtex pré-frontal dorsolateral antes de um
indivíduo se alimentar, mas o estudo atual foi o primeiro a incluir uma técnica
de imagem cerebral para examinar as respostas neurais à estimulação e a imagens
de alimentos”, diz.
De acordo com o cientista, o experimento pode ajudar no
desenvolvimento de terapias, já que traz novos dados sobre o funcionamento do
cérebro e sobre como lidar com a fome. “Os resultados podem não informar
diretamente os tratamentos médicos. No entanto, entender como o cérebro
processa informações sobre alimentos altamente calóricos e como os sistemas de
autocontrole modulam isso pode ser importante para determinar como podemos
ajudar pessoas que sofrem de transtornos da alimentação impulsiva, por exemplo,
bulimia, compulsão alimentar e obesidade”, ressalta Hall.
Mais pesquisas ajudarão a entender como a EMT pode ser usada
para interferir no controle cerebral, segundo os autores. Mas eles destacam que
essa não é a única possibilidade de influenciar a funcionalidade do córtex
pré-frontal dorsolateral. “Vários fatores relacionados ao estilo de vida afetam
a função dele — por exemplo, a prática de exercícios aeróbicos. Por outro lado,
a falta de sono e o estresse podem prejudicá-lo”, ilustra Cassandra Lowe,
principal autora do estudo e professora da Escola de Saúde Pública da
Universidade de Waterloo.
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Cláudio Carneiro, coordenador de Neurologia do Hospital
Santa Lúcia, em Brasília, e membro titular da Sociedade Brasileira de
Neurologia, avalia que o trabalho da equipe canadense enriquece uma área da
medicina bastante promissora que tem gerado expectativa na sociedade, cada vez
mais atingida pelo excesso de peso. “O consumo de alimentos calóricos em
excesso é um grande problema. Acredito que especialistas que conseguirem
combater esse comportamento vão ganhar um grande destaque na área, no nível
Prêmio Nobel.”
Usar a EMT em intervenções é uma possibilidade, diz o
médico. “Seria uma maneira de intervir usando uma técnica que já é usada na
área médica para tratar enfermidades”, justifica. “Também acredito que possam
ser criadas substâncias que alterem esse funcionamento cerebral. Porém, ainda é
cedo para dizer. Esse estudo foi feito com uma quantidade reduzida de pessoas,
uma análise mais ampla é necessária para confirmar as descobertas.”
O próximo passo da equipe, porém, terá uma abordagem mais
coletiva. “Examinaremos maneiras pelas quais o ambiente social torna a
implementação do autocontrole mais ou menos provável de ser bem-sucedida, com
foco em alguns desses mesmos sistemas cerebrais”, adianta Hall. // TOMADO DE
CORREEIO BRAZILIENSE
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