Novo defensor dos agrotóxicos, Nizan Guanaes tem casa de
campo com horta orgânica. Por Alceu Castilho
Publicado originalmente no site De
Olho Nos Ruralistas
POR ALCEU CASTILHO
Consultor empolgado da CNA. Nizan Guanaes (Foto: Reprodução)
Um dos publicitários mais badalados do país, Nizan Guanaes
tem seu pé no agronegócio há pelo menos 15 anos, quando – mesmo sem ter fazenda
– entrou no mercado da venda de touros Angus. Pelo sistema Top Class: metade do
investidor, metade da empresa agropecuária. Um dos maiores entusiastas desse
sistema, e colega de leilões de Guanaes, era o locutor Galvão Bueno, da Globo.
Guanaes acaba de entrar no noticiário por ter sido
contratado como consultor pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil
(CNA). Sua missão, promover o agronegócio. Em particular, os agrotóxicos, no
momento em que a Câmara discute o chamado PL do Veneno, o PL 6.299/02, agora
recheado de aditivos, que flexibiliza o uso dos pesticidas no Brasil.
A notícia dada pelo blog de Andréia Sadi, no G1, pegou
os socioambientalistas de surpresa. Mas a relação do publicitário com o
agronegócio vem de longe. Ele tem participado de inúmeros encontros do setor,
com o mantra de que o modelo precisa vender melhor sua imagem.
“Só chamar agrotóxico já mostra que o setor se comunica
mal”, afirmou Guanaes à repórter. Ele disse que não gosta de ser associado à
bancada ruralista. Principal interessada, observou Andréia, no projeto em
debate no Congresso. “Meu papel é fazer o setor se comunicar melhor, nem canonização
nem satanização”.
Guanaes não fala como um contratado distante, apenas um
assalariado a serviço de uma classe à qual não pertence. Habitué das altas
rodas, ele também é empresário – foi dono de várias agências de publicidade – e
está acostumado a conviver com aqueles que contratam seus préstimos. Alguns
deles são seus vizinhos.
NA BOA VISTA, A FINA FLOR DA ELITE PAULISTANA
O condomínio rural Fazenda Boa Vista tornou-se mais
conhecido após a inauguração do Hotel Fasano, no ano passado, em sua versão
rural. Mas o complexo de 1.200 hectares já atraía desde 2007 os endinheirados
de São Paulo, quando foi lançado pelo mesmo grupo que construiu o Shopping
Cidade Jardim – onde a elite paulistana torra parte de seus cobres.
O lançamento contou com a cantora jamaicana Grace Jones.
Entre os condôminos de primeira viagem (banqueiros, empresários, grandes
advogados) está Nizan Guanaes. Em Porto Feliz, a 100 quilômetros da capital,
eles têm suas casas de campo, rodeados por 4 mil funcionários. “Onde os ricos
descansam”, como definiu O Globo.
Segundo a VejaSP, a Fazenda Boa Vista tem um campo
de polo, dois campos de golfe e doze quadras de tênis. Uma delas, em 2012,
recebeu a russa Maria Sharapova para um jogo-exibição. Nas
instalações hípicas, quatro picadeiros. As cocheiras têm piso de borracha e,
relata a revista, “bordas arredondadas para que os cavalos não se machuquem em
quinas traiçoeiras”.
A fazenda tem área de preservação ambiental e uma horta
orgânica. “Lá, você vai ver coisas lindas, como tomate cereja, mini berinjela,
papaia, cebolinha, cenoura”, descrevia em 2014 o blog Magali Viajante.
“Tudo orgânico e cultivado com muito carinho pelo seu Djalma”. A horta é
destinada tanto aos cozinheiros do Fasano como aos condôminos.
De Olho nos Ruralistas identificou pelo menos dez imóveis à
venda na Boa Vista, por preços que vão de R$ 3,5 milhões(“linda vista do
vale com mata nativa preservada”) até R$ 13 milhões. Nenhum desses
moradores se esqueceu de assinalar nos anúncios os itens “fazendinha e horta orgânica
para consumo próprio do condomínio”.
Nesta terça-feira (20/06), no Twitter, o jornalista André
Trigueiro lembrou que, em 2014, Guanaes escreveu estas palavras – as frases
foram aqui agrupadas – na Folha: “A comida do futuro é orgânica. As
pessoas estão cada vez mais preocupadas em comer e em dormir livres de
substâncias químicas. Ninguém pode nos salvar a não ser nós mesmos”.
DO FASANO AO AGRONEGÓCIO, O “EMBAIXADOR”
Nem todos os moradores da Fazenda Boa Vista têm seus nomes
divulgados. O do publicitário Nizan Guanaes, porém, sempre aparece nas
reportagens. Seu nome é, em si, uma marca, assim como o sobrenome Fasano. Ele e
Rogério Fasano são parceiros no projeto Reserva Trancoso, na Praia de
Itapororoca, que será lançado em 2019 no município baiano. Guanaes é o “embaixador”.
A palavra serve para ilustrar o que ele tem feito pelo
agronegócio nos últimos anos. A figura sorridente de Guanaes aparece em
diversos pontos do país, a promover o modelo – não custa lembrar, não
exatamente o único na relação com as propriedades e os recursos naturais.
“Se o Brasil fosse um terreno, na frente do Atlântico, com
uma vasta extensão de terra, exploraríamos agricultura e turismo, porque é o
óbvio”, afirmou o publicitário, durante fórum sobre agronegócio da
revista Exame. “No Brasil, o agronegócio é muito bom em fazer, mas é
péssimo em se vender”.
O empresário prosseguiu:
– É impressionante que o setor do agronegócio seja um
vencedor por ele mesmo, com suas próprias forças, a despeito do estado e da
legislação. Somos um país capitalista que tem horror a lucro. Esse setor já faz
muito pelo Brasil, muito mais do que o Brasil faz por ele.
ELE VÊ AGRONEGÓCIO COMO MARCA GLOBAL
Guanaes enxerga o agronegócio brasileiro como marca global.
“Se o agronegócio quisesse dominar todos os principais aeroportos do mundo, ele
conseguiria”, definiu.
Em reunião da Comissão Nacional de Bovinocultura de Corte,
da CNA, em maio, o publicitário disse que o setor agropecuário precisa
contar suas histórias de sucesso para o Brasil e para o mundo. (Esse debate específico
acontece no contexto da crise de exportações para a Europa, após a Operação
Carne Fraca.)
Ele trabalha duro para emplacar suas teses. A repórter
Andréia Sadi, da Globo, contou no G1 que Guanaes procurou ambientalistas nesta
semana para defender ideias do projeto de lei dos agrotóxicos.
O publicitário é bem relacionado. Durante a posse do
pecuarista João Martins da Silva Junior – seu conterrâneo – como
presidente reeleito da CNA, em dezembro, em Brasília, ele falou sobre
agronegócio brasileiro. Da cerimônia participaram ministros, parlamentares e o
presidente Michel Temer.
Um ano antes, em dezembro de 2016, Temer ouviu de Guanaes o
seguinte conselho: “Aproveite sua impopularidade para fazer o que precisa ser
feito”.
Em julho daquele ano, ainda durante a interinidade do atual
presidente, ambos participaram do Global Agribusiness Fórum 2016, em São Paulo.
Um evento promovido pela Sociedade Rural Brasileira, pela Associação Brasileira
dos Produtores de Milho (Abramilho) e pela Associação Brasileira dos Criadores
de Gado Zebu.
A Abramilho é uma das mantenedoras do Instituto Pensar Agro
(IPA), por sua vez financiadora da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA),
que banca projetos como a revisão da lei de agrotóxicos. Mais da metade dos
votos que salvaram Temer, em agosto e outubro de 2017, saíram de membros da
FPA: “55% dos novos votos a favor de Temer saíram da Frente Parlamentar da
Agropecuária”.
AS VACAS DE GUANAES E GALVÃO
Quinze anos atrás, a Folha noticiava
a migração de investidores do asfalto para o campo. Os exemplos citados eram os
de Nizan Guanaes e Galvão Bueno. O publicitário estivera em Barra Bonita, no
interior paulista, em leilão promovido pela Chalet Agropecuária, do pecuarista
Luiz Eduardo Batalha – fornecedor mundial do Burger King.
Os dois lances mais caros foram arrematados por Guanaes: 50%
da vaca FLC Canyon, por R$ 93,8 mil, e 50% da mimosa Três Marias, por R$ 77
mil. Sempre metade do preço, pois, por esse sistema, os animais continuam com a
empresa agropecuária. Na ocasião o publicitário fazia planos para comprar uma
fazenda, “provavelmente em São Paulo”.
O paranaense Galvão Bueno, ele mesmo promotor de leilões em
Londrina (PR), também é um entusiasta da raça Angus. Naquele leilão, em junho
de 2003, o locutor gastou R$ 63,4 mil em compras e R$ 29,4 mil em vendas de
gado.
No ano seguinte, após um leilão de Batalha no Copacabana
Palace, Guanaes informou em entrevista à revista Época que tinha
“umas 20 vaquinhas”, sempre Angus. Ele ainda se considerava um novato no
negócio. Em São Paulo, vendera uma vaca – ou meia vaca – por R$ 37,8 mil. “Meus
amigos me estimularam, achei divertido participar dos lances”.
Em 2005, o leilão ocorreu no DirecTV Music Hall, em São
Paulo. Lá estavam, de novo, Galvão e Guanaes. O publicitário vendeu duas
novilhas por R$ 18.200. O locutor, uma, por R$ 9.100. Outro investidor era o
então presidente da Ford no Brasil – coincidentemente uma das empresas que, nos
últimos anos, patrocinaram a campanha “O Agro é Pop”, da Globo.
Essa campanha – igualmente de promoção do agronegócio – não
foi feita por Guanaes. Mas ele já teve uma relação direta com uma afiliada da
emissora, a RBS. Em 2006 ele começou a prestar consultoria para a RBS para
mudar a identidade visual e a linha editorial do Canal Rural. Seu objetivo era
fazer do canal “a CNN do campo”.
O Canal Rural foi vendido em 2013 para a J&F
Investimentos, a holding da JBS – outra patrocinadora da campanha “O Agro é
Pop”. Em processo de venda de ativos após a deflagração da Operação Lava-Jato,
o grupo tenta há alguns meses vender o canal.
DE OLHO NO PARAGUAI
Foi no Hotel Fasano Boa Vista que se casou Manuela Jacintho
Ferraz, neta de Jacintho Honório da Silva Filho (ele é réu no caso do
assassinato do cacique Marcos Veron, liderança Guarani Kaiowá assassinada no
Mato Grosso do Sul em 2003) e filha de Marcelo Bastos Ferraz, dono de terras no
Chaco. Confira essa história na série De Olho no Paraguai: “’Barão da carne’
avança em terra Ayoreo; no MS, família é ré no caso Marcos Veron”. // tomado de envio de dcm
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